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{"id":100467,"date":"2021-12-30T12:36:19","date_gmt":"2021-12-30T15:36:19","guid":{"rendered":"https:\/\/teatrohoje.com.br\/?p=100467"},"modified":"2022-06-13T09:14:38","modified_gmt":"2022-06-13T12:14:38","slug":"o-teatro-de-artaud-entre-a-mitologia-e-a-peste","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/teatrohoje.com.br\/2021\/12\/30\/o-teatro-de-artaud-entre-a-mitologia-e-a-peste\/","title":{"rendered":"O TEATRO DE ARTAUD – ENTRE A MITOLOGIA E A PESTE"},"content":{"rendered":"

Resumo: O artigo tem como objetivo contribuir para uma reflex\u00e3o sobre o teatro proposto por Antonin Artaud e sua rela\u00e7\u00e3o com a mitologia e a peste. Se, por um lado, a mitologia pode ser entendida como uma narrativa que explica como o mundo e a humanidade foram constru\u00eddos para a forma que ent\u00e3o conhecemos, conv\u00e9m analisar que em muitos de seus escritos Artaud se manifesta como um verdadeiro iconoclasta, que em sua origem grega eikon (\u00edcone ou imagem) e klastein (quebrar) significa \u201cquebrador de imagem\u201d. Quanto \u00e0 peste Artaud acredita na sua capacidade de instalar a desordem e provocar conflitos para, assim, permitir a revela\u00e7\u00e3o de verdades socialmente insuport\u00e1veis, como propunha em seu \u201cteatro da crueldade\u201d.<\/h3>\n

<\/h3>\n

O TEATRO DE ARTAUD \u2013 ENTRE A MITOLOGIA E A PESTE<\/h3>\n

Wilson Co\u00ealho<\/h3>\n

Se pensarmos a mitologia como uma narrativa que explica como o mundo e a humanidade foram constru\u00eddos para a forma que ent\u00e3o conhecemos, podemos tamb\u00e9m concordar com a ideia de que, na tentativa de entender o significado de sua exist\u00eancia, o ser humano sentiu a necessidade de projetar-se para fora de si mesmo. Assim, a origem do mito pode estar no desejo e na necessidade do ser humano de enfrentar o mundo, bem como, para fugir do medo e inseguran\u00e7a frente \u00e0s for\u00e7as da natureza que at\u00e9 hoje s\u00e3o assustadoras. De certa forma, a cria\u00e7\u00e3o dos mitos tamb\u00e9m pode ser vista como a necessidade de inventar e depositar nos mesmos uma esp\u00e9cie de compensa\u00e7\u00e3o para a fragilidade dos humanos, ao mesmo tempo que lhe d\u00e3o a possibilidade de se acreditarem entendendo ao mundo e a si mesmos, como se fora a possibilidade de se acomodarem e se tranquilizarem perante os mist\u00e9rios da vida. Nesse sentido, a mitologia se sustenta basicamente em dois pilares: a cosmogonia e a teogonia. E, entendendo a cosmogonia como uma tentativa de organiza\u00e7\u00e3o do caos a partir de alguns modelos relacionados \u00e0 exist\u00eancia com origem no cosmos ou no universo. Trata-se de uma especula\u00e7\u00e3o sobre a forma\u00e7\u00e3o do mundo. A teogonia, por sua vez, se d\u00e1 na cria\u00e7\u00e3o de divindades para a representa\u00e7\u00e3o de fen\u00f4menos ou aspectos da natureza, de certa forma, humanizada, para expressar as ideias sobre a constitui\u00e7\u00e3o de regentes para o universo. Havemos de tamb\u00e9m convir que tudo isso passa pela cultura, ou seja, que o universo n\u00e3o se trata de um absoluto, considerando que cada povo se organizou a partir da cria\u00e7\u00e3o de seus pr\u00f3prios universos ou mundos. Assim, existem tantos universos ou mundos quanto existem culturas. Obviamente, muitas delas vem sendo assassinadas a mediante o projeto colonialista e hegem\u00f4nico do mundo ocidental capitalista.<\/h3>\n

Depois, surge a filosofia como uma necessidade de supera\u00e7\u00e3o dos mitos e rompimento com a teodiceia. Nessa tentativa de abandonar e superar a cren\u00e7a m\u00edtica, a filosofia busca a raz\u00e3o e a l\u00f3gica como pressupostos b\u00e1sicos para o pensar. Muito embora n\u00e3o devamos nos esquecer que muitas das \u201cciviliza\u00e7\u00f5es\u201d ou culturas em nosso planeta prop\u00f5em alguns pensamentos filos\u00f3ficos ainda ligados \u00e0 tradi\u00e7\u00e3o religiosa de seus povos.<\/h3>\n

Mas como situar Antonin Artaud nesse contexto? Primeiramente, acredito que o passo fundamental \u00e9 desmitificar o pr\u00f3prio Artaud e traz\u00ea-lo para o plano humano, para que sua obra seja entendida nessa condi\u00e7\u00e3o e n\u00e3o como mito que \u00e9 o espa\u00e7o do inalcan\u00e7\u00e1vel. N\u00e3o que sua obra seja de f\u00e1cil apreens\u00e3o, mas que \u00e9 resultado de uma viv\u00eancia e de experi\u00eancias realizadas dentro de um contexto hist\u00f3rico e que se produziu a partir de uma busca e posicionamento contra a cultura e o pensamento de uma sociedade aprisionada e engessada em conceitos em que predomina um modelo escravagista e tirano em prol de um establishment que, para al\u00e9m do humano, t\u00eam as preocupa\u00e7\u00f5es voltadas para uma\u00a0ordem<\/a>\u00a0ideol\u00f3gica<\/a> e \u00a0pol\u00edtica<\/a>\u00a0que constitui uma elite tanto econ\u00f4mica quanto intelectual atrav\u00e9s do controle de um\u00a0Estado<\/a>.<\/h3>\n

Nesse sentido de desmitificar Artaud, podemos creditar \u00e0 Florence de M\u00e9redieu um certo pioneirismo desta tarefa, considerando a grande e imprescind\u00edvel obra C\u2019\u00e9tait Antonin Artaud (publicada no Brasil pela Perspectiva sob o t\u00edtulo Eis Antonin Artaud). Com essa edi\u00e7\u00e3o, podemos dizer que a Fran\u00e7a resgata uma d\u00edvida com o escritor, dramaturgo, poeta, missivista, roteirista, encenador, ator de teatro e cinema, figurinista, cen\u00f3grafo, desenhista, pensador e criador do \u201cTeatro da Crueldade\u201d.<\/h3>\n

E, voltando a Artaud, a partir dele mesmo, podemos citar a sua conhecida Carta aos Reitores das Universidades Europeias<\/em>, onde come\u00e7a dizendo:<\/strong><\/h3>\n

\u201cNa estreita cisterna que os Senhores chamam de “Pensamento”, os raios espirituais apodrecem como a palha.<\/h3>\n

Chega de jogos de linguagem, de artif\u00edcios da sintaxe, de prestidigita\u00e7\u00f5es com f\u00f3rmulas, agora \u00e9 preciso encontrar a grande Lei do cora\u00e7\u00e3o, a Lei que n\u00e3o seja uma lei, uma pris\u00e3o, mas um guia para o Esp\u00edrito perdido no seu pr\u00f3prio labirinto. Al\u00e9m daquilo que a ci\u00eancia jamais conseguir\u00e1 alcan\u00e7ar, l\u00e1 onde os feixes da raz\u00e3o se partem contra as nuvens, existe esse labirinto, n\u00facleo central para o qual convergem todas as for\u00e7as do ser, as nervuras \u00faltimas do Esp\u00edrito. Nesse d\u00e9dalo de muralhas m\u00f3veis e sempre removidas, fora de todas as formas conhecidas do pensamento, nosso Esp\u00edrito se agita, espreitando seus movimentos mais secretos e espont\u00e2neos, aqueles com um car\u00e1ter de revela\u00e7\u00e3o, essa \u00e1ria vinda de longe, ca\u00edda do c\u00e9u\u201d.<\/h3>\n

<\/h3>\n

Numa outra de suas cartas, consideradas com uma de suas marcas, Artaud escreve Aos Diretores de Asilos de Loucos, e come\u00e7a afirmando que:<\/h3>\n

<\/h3>\n

\u201cAs leis e os costumes, concedem-lhes o direito de medir o esp\u00edrito. Esta jurisdi\u00e7\u00e3o soberana e terr\u00edvel, voc\u00eas a exercem segundo vossos pr\u00f3prios padr\u00f5es de entendimento. N\u00e3o nos fa\u00e7am rir. A credulidade dos povos civilizados, dos especialistas, dos governantes, enfeita a psiquiatria de inexplic\u00e1veis luzes sobrenaturais. A profiss\u00e3o que voc\u00eas exercem est\u00e1 julgada de antem\u00e3o. N\u00e3o pensamos em discutir aqui o valor dessa ci\u00eancia, nem a duvidosa exist\u00eancia das doen\u00e7as mentais. Por\u00e9m para cada cem pretendidas patogenias, onde se desencadeia a confus\u00e3o da mat\u00e9ria e do esp\u00edrito, para cada cem classifica\u00e7\u00f5es, onde as mais vagas s\u00e3o tamb\u00e9m as \u00fanicas utiliz\u00e1veis, quantas tentativas nobres se contam para conseguir melhor compreens\u00e3o do mundo irreal onde vivem aqueles que voc\u00eas encarceraram? Quantos de voc\u00eas, por exemplo, consideram que o sonho do demente precoce ou as imagens que o perseguem s\u00e3o algo mais que uma salada de palavras? N\u00e3o nos surpreende ver at\u00e9 que ponto voc\u00eas est\u00e3o empenhados numa tarefa para a qual s\u00f3 existem alguns poucos predestinados. Por\u00e9m nos rebelamos contra o direito concedido a certos homens \u2013 capazes ou n\u00e3o \u2013 de dar por terminadas suas investiga\u00e7\u00f5es no campo do esp\u00edrito com um veredito de encarceramento perp\u00e9tuo.<\/h3>\n

<\/h3>\n

E termina dizendo:<\/h3>\n

<\/h3>\n

\u201cEsperamos que amanh\u00e3 de manh\u00e3, na hora da visita m\u00e9dica, recordem isto, quando tratarem de conversar sem dicion\u00e1rio com esses homens sobre os quais \u2013 reconhe\u00e7am \u2013 os senhores s\u00f3 t\u00eam a superioridade da for\u00e7a\u201d.<\/h3>\n

<\/h3>\n

Ainda em rela\u00e7\u00e3o ao seu desafio sobre a ideia de sanidade e loucura, Artaud faz o seu desafio:<\/h3>\n

\u201cSenhores! E o que \u00e9 um aut\u00eantico louco?<\/h3>\n

\u00c9 um homem que preferiu enlouquecer<\/h3>\n

no sentido em que a sociedade entende a palavra<\/h3>\n

em vez de trair uma determinada id\u00e9ia<\/h3>\n

superior de honra humana.<\/h3>\n

Assim, a sociedade mandou estrangular<\/h3>\n

nos seus manic\u00f4mios<\/h3>\n

todos aqueles dos quais queria<\/h3>\n

se desembara\u00e7ar ou se defender<\/h3>\n

porque eles se recusavam a ser c\u00famplices<\/h3>\n

em certos atos de suprema sujeira.<\/h3>\n

Pois o louco \u00e9 tamb\u00e9m o homem<\/h3>\n

que a sociedade n\u00e3o quis ouvir<\/h3>\n

e que \u00e9 impedido de enunciar<\/h3>\n

certas verdades insuport\u00e1veis\u201d.<\/h3>\n

<\/h3>\n

Na obra Para acabar com o julgamento de deus<\/em> (que, inclusive, faz quest\u00e3o de escrever deus com letra min\u00fascula), Artaud se insere contra a mitologia crist\u00e3 via coloniza\u00e7\u00e3o europeia. Num dos trechos dessa obra radiof\u00f4nica ele diz que:<\/h3>\n

<\/h3>\n

\u201cE de onde vem essa obje\u00e7\u00e3o \u00e0 imund\u00edcie? Do fato de que o mundo n\u00e3o \u00e9 ainda constitu\u00eddo, ou de que o homem n\u00e3o tem mais que uma pequena id\u00e9ia do mundo e que ele quer eternamente guardar? Isso vem do que um homem, um belo dia, tem conclu\u00eddo a ideia de mundo.<\/h3>\n

Duas rotas se oferecem a ele<\/h3>\n

essa do infinito exterior<\/h3>\n

essa do \u00ednfimo interior.<\/h3>\n

E ele tem preferido o \u00ednfimo interior. L\u00e1 onde ele n\u00e3o tem que comprimir…<\/h3>\n

o rato<\/h3>\n

a l\u00edngua<\/h3>\n

o \u00e2nus<\/h3>\n

ou a glande.<\/h3>\n

E deus,<\/h3>\n

ele mesmo<\/h3>\n

apressou o movimento.<\/h3>\n

Deus \u00e9 um ser?<\/h3>\n

Se ele \u00e9, \u00e9 merda.<\/h3>\n

Se ele n\u00e3o \u00e9<\/h3>\n

ele n\u00e3o \u00e9.<\/h3>\n

Ora, ele n\u00e3o \u00e9, mas como o vazio que avan\u00e7a com todas as suas formas\u201d.<\/h3>\n

<\/h3>\n

Uma das quest\u00f5es mais interessantes que podemos notar nessa obra Para acabar com o julgamento de deus, \u00e9 sua preocupa\u00e7\u00e3o com uma cultura que, de alguma forma, ele acreditava estar livre do pensamento ocidental, em especial, o europeu. Trata-se do seu encontro com os Tarahumaras no M\u00e9xico, quando os visitou em 1936. Obviamente, ele se decepcionou em algum sentido, considerando que os mesmos j\u00e1 estavam afetados pelos invasores europeus. E, baseado nisso, regata o Ritual do Tutuguri ou o Rito do Sol Negro, onde coloca em quest\u00e3o o encontro das culturas. E nessa obra ele cria a senten\u00e7a do Corpo Sem \u00d3rg\u00e3os que muita gente tem se debru\u00e7ado em explicar, infelizmente aos olhos da psican\u00e1lise ou da sociologia, perdendo assim a possibilidade de compreender o grito de seu esp\u00edrito em busca de uma po\u00e9tica origin\u00e1ria. Para Artaud, o Corpo Sem \u00d3rg\u00e3os significa submeter o homem a uma cirurgia. Mas n\u00e3o se trata de uma cirurgia medicinal e \u2013 sim \u2013 de uma opera\u00e7\u00e3o ontol\u00f3gica, onde o homem deveria raspar toda a sua carne e recriar-se a partir do seu osso. Limpar-se de todos os desejos constru\u00eddos pelos psicologismos e pelo mito da chamada civiliza\u00e7\u00e3o. Uma aboli\u00e7\u00e3o dos desejos em prol da vontade, daquilo que est\u00e1 em pot\u00eancia nesses seres origin\u00e1rios. De fato, a verdadeira obsess\u00e3o de Artaud \u00e9 a pureza. E, para alcan\u00e7ar essa pureza ele necessita destruir a imund\u00edcie, mas para destru\u00ed-la ele precisa fazer com que ela apare\u00e7a ao dia em toda a sua imensa sujeira, tir\u00e1-la do estado enrustido ou recalcado como instrumento de defesa e traz\u00ea-la \u00e0 tona para despeda\u00e7\u00e1-la. Por isso, muitas vezes, o exerc\u00edcio da obscenidade, da porcaria, espalhando a fecalidade em abund\u00e2ncia. A vontade de Artaud era fazer voar em explos\u00e3o a antiga ordem criada por \u201cdeus\u201d, para reedificar um corpo novo, como assim ele disse em alto e bom som: \u2013 \u201ceu reconstruirei o homem que sou\u201d \u2013 e enfim puro.<\/h3>\n

Mas ele tamb\u00e9m acredita que essa reconstru\u00e7\u00e3o do corpo passa por uma reinven\u00e7\u00e3o da linguagem. As palavras est\u00e3o gastas e organizadas em silogismos de uma l\u00f3gica formal. E nesse sentido ele acredita que o sentido de palavra se d\u00e1 na n\u00e3o-palavra, ou seja, para que a palavra exista, faz-se necess\u00e1rio que a mesma se despoje de s\u00ea-la enquanto tal. Em certo sentido, d\u00e1-se como um existencialismo, considerando que, ao se fazer palavra, a palavra n\u00e3o se sustenta de uma fun\u00e7\u00e3o ou um significado a priori<\/em>. A palavra \u00e9 uma p\u00e1 que lavra, \u00e9 uma p\u00e1 diante do terreno baldio e desconhecido da exist\u00eancia, onde se cria sulcos para uma tentativa de conhecimento e apreens\u00e3o disso que
\nn\u00e3o sabemos o que \u00e9, desse vir a ser do esp\u00edrito que se manifesta, mesmo atrav\u00e9s de recursos da glossolalia, como, por exemplo, ainda em Pour en finir avec le jugement de dieu <\/em>(Para acabar com o julgamento de deus):<\/h3>\n

<\/h3>\n

O reche modo
\nto edire
\ndi za
\ntan dari
\ndo padera coco.<\/strong><\/h3>\n

\u00a0<\/strong><\/h3>\n

\u00a0<\/strong><\/h3>\n

Para Artaud, essas glossolalias, ou seja, essas palavras-gritos s\u00e3o os gritos-sopros que certamente surpreender\u00e3o, n\u00e3o como mero espanto, mas como possibilidade de se perceber a pot\u00eancia dos ritmos e a fabulosa riqueza da inven\u00e7\u00e3o sil\u00e1bica, da liberdade do esp\u00edrito para criar e colocar-se no mundo.<\/h3>\n

Mas para se ter essas experi\u00eancias, principalmente, no que se diz respeito ao teatro, Artaud acreditava que seria preciso Acabar com as obras primas, um dos cap\u00edtulos de O Teatro e seu Duplo, pois \u2013 para ele \u2013 de alguma maneira n\u00f3s somos culpados por acreditarmos que o que est\u00e1 escrito ou pintado ou formulado j\u00e1 fosse uma quest\u00e3o esgotada e que n\u00e3o fosse necess\u00e1rio romper com elas e come\u00e7ar de novo. Nesse cap\u00edtulo, Acabar com as obras primas, ele diz que:<\/h3>\n

<\/h3>\n

\u201c\u00c9 preciso acabar com a ideia das obras-primas reservadas a uma assim chamada elite e que a massa n\u00e3o entende; e admitir que n\u00e3o existe, no esp\u00edrito, uma zona reservada, como para as liga\u00e7\u00f5es sexuais clandestinas.<\/h3>\n

As obras-primas do passado s\u00e3o boas para o passado, n\u00e3o para n\u00f3s. Temos o direito de dizer o que foi dito e mesmo o que n\u00e3o foi dito de um modo que seja nosso, imediato, direto, que responda aos modos de sentir atuais e que todo o mundo compreenda.\u201d<\/h3>\n

<\/h3>\n

Artaud acredita que se o povo se desacostumou e n\u00e3o lhe interessa ir ao teatro e consider\u00e1-lo como uma arte inferior e usado meramente como uma sa\u00edda para nossos maus instintos, \u00e9 porque fomos habituados desde a Renascen\u00e7a a pensar no teatro como puramente descritivo, como uma mentira e uma ilus\u00e3o que n\u00e3o faz outra coisa sen\u00e3o tentar narrar a psicologia do nosso tempo. E, da psicologia, ele acredita que ela cumpre o vergonhoso papel de reduzir o desconhecido ao conhecido. Da mesma forma como o teatro vem cumprindo essa tarefa de fazer viver em cena seres plaus\u00edveis, com o espet\u00e1culo de um lado e a plateia do outro, sem o ritual onde todos est\u00e3o inclu\u00eddos. E novamente ele se manifesta iconoclasta, primeiro, com S\u00f3focles:<\/h3>\n

\u201c\u00c9 idiotice censurar a massa por n\u00e3o ter o senso do sublime, quando se confunde o sublime com uma de suas manifesta\u00e7\u00f5es formais que s\u00e3o, ali\u00e1s, e sempre, manifesta\u00e7\u00f5es mortas. E se, por exemplo, a massa de hoje j\u00e1 n\u00e3o compreende \u00c9dipo rei<\/em>, ouso dizer que a culpa \u00e9 de \u00c9dipo rei <\/em>e n\u00e3o da massa.<\/h3>\n

Em \u00c9dipo rei<\/em> h\u00e1 o tema do Incesto e a ideia de que a natureza zomba da moral; e que em algum lugar h\u00e1 for\u00e7as errantes com as quais seria bom tomar cuidado; que se d\u00ea a essas for\u00e7as o nome de destino<\/em> ou outro qualquer.<\/h3>\n

Al\u00e9m disso, h\u00e1 a presen\u00e7a de uma epidemia de peste que \u00e9 uma encarna\u00e7\u00e3o f\u00edsica dessas for\u00e7as. Mas tudo isso sob disfarces e numa linguagem que perderam qualquer contato com o ritmo epil\u00e9ptico e grosseiro deste tempo. S\u00f3focles talvez fale alto, mas com modos que j\u00e1 n\u00e3o s\u00e3o desta \u00e9poca. Ele fala fino demais para esta \u00e9poca, e parece que ele fala de lado\u201d.<\/h3>\n

<\/h3>\n

E, depois, com o famoso bardo ingl\u00eas:<\/h3>\n

<\/h3>\n

\u201cO pr\u00f3prio Shakespeare \u00e9 respons\u00e1vel por esta aberra\u00e7\u00e3o e degrada\u00e7\u00e3o, por essa ideia desinteressada do teatro que quer que uma representa\u00e7\u00e3o teatral deixe o p\u00fablico intacto, sem que uma imagem lan\u00e7ada provoque qualquer abalo no organismo, imprimindo nele uma marca que n\u00e3o mais se apagar\u00e1.<\/h3>\n

Se em Shakespeare o homem \u00e0s vezes se preocupa com aquilo que o ultrapassa, trata-se sempre, definitivamente, das consequ\u00eancias dessa preocupa\u00e7\u00e3o no homem, isto \u00e9, a psicologia.<\/h3>\n

(…)<\/h3>\n

Se Shakespeare e seus imitadores nos insinuaram atrav\u00e9s dos tempos uma ideia da arte pela arte, com a arte de um lado e a vida do outro, pod\u00edamos ficar tranquilos com a ideia ineficaz e pregui\u00e7osa enquanto a vida l\u00e1 fora se mantinha. Mas agora vemos muito bem os sinais indicadores de que o que nos mantinha vivos j\u00e1 n\u00e3o se mant\u00e9m, de que estamos todos loucos, desesperados e doentes. E eu nos<\/em> convido a reagir\u201d.<\/h3>\n

<\/h3>\n

No que diz respeito \u00e0 filosofia, tamb\u00e9m parece importante localizar Artaud neste suposto \u201camor \u00e0 sabedoria\u201d. De imediato, podemos afirmar que \u2013 apesar de demonstrar ter lido obras de Plat\u00e3o, Arist\u00f3teles, S\u00f6ren Kierkegaard e alguns outros \u2013 suas grandes influ\u00eancias ou talvez coincid\u00eancia, considerando sua postura de rebeldia contra o institu\u00eddo \u2013 dois fil\u00f3sofos que marcadamente est\u00e3o presente em sua obra s\u00e3o Arthur Schopenhauer e Friedrich Nietsche.<\/h3>\n

De Schopenhauer podemos nos ater em As dores do mundo<\/em>, quando o fil\u00f3sofo nos apresenta uma s\u00e9rie de reflex\u00f5es sobre a exist\u00eancia, propondo uma nova forma de se pensar a dor e a felicidade, embora essa \u00faltima n\u00e3o seja um tema muito comum ao discurso de Artaud. Mas coincidindo com Artaud, os dois defendem a ideia de que ao contr\u00e1rio do bem, o mal \u00e9 que deve ser considerado positivo, uma vez que somente ele se faz, de fato, sentir. A outra obra de Schopenhauer que tamb\u00e9m nos aproxima de uma an\u00e1lise sobre Artaud, est\u00e1 em O mundo como vontade e representa\u00e7\u00e3o, quando o fil\u00f3sofo afirma a superioridade da vontade em detrimento da raz\u00e3o, inclusive, pela ideia de que toda a vida \u00e9 vontade e que raz\u00e3o serve somente para justific\u00e1-la ou reprimi-la, considerando que toda essa subst\u00e2ncia primordial chamada Vontade se estende a todos os demais seres, concebendo-a, assim, como ess\u00eancia n\u00e3o s\u00f3 do homem, mas do mundo.<\/h3>\n

No caso de Nietsche, independente de outras obras que Artaud tenha lido desse fil\u00f3sofo, podemos nos amparar, levando em conta o tema do teatro, em O Nascimento da Trag\u00e9dia. <\/em>Mas apesar de supostamente a crueldade <\/em>de Artaud parecer uma deriva\u00e7\u00e3o da crueldade dionis\u00edaca de Nietsche, em muito eles se diferem. Se, para Nietsche, em O Nascimento da Trag\u00e9dia<\/em>, os gregos conheceram e sentiram a ang\u00fastia e os horrores da exist\u00eancia a partir de uma perturba\u00e7\u00e3o do homem perante os poderes tit\u00e2nicos da natureza, representados por Moira, Prometeu, \u00c9dipo e tantos outros fazendo aparecer o esp\u00edrito apol\u00edneo<\/em> como uma possibilidade de reagir em prol da vida, projetando as imagens luminosas sobre essa “parede obscura” que representa “uma vis\u00e3o profunda do horr\u00edvel da natureza\u201d, Artaud as renega para reencontrar o tr\u00e1gico na sua pureza, ou seja, entender a viol\u00eancia como algo que \u00e9 natural. De certa forma, Nietsche diante de Artaud parece apenas ser dial\u00e9tico. Mas o que \u00e9 a dial\u00e9tica sen\u00e3o a busca de uma s\u00edntese da contradi\u00e7\u00e3o de dois lados de uma mesma moeda? Se a dial\u00e9tica \u00e9 a arte do di\u00e1logo, esse somente se realiza dentro de um mesmo plano, ou seja, s\u00f3 consegue entender a diferen\u00e7a entre os iguais.<\/h3>\n

Em termos de filosofia, assim como dizia Karl Marx, que \u201cos fil\u00f3sofos se limitaram a interpretar o mundo de diversas maneiras; o que importa \u00e9 modific\u00e1-lo\u201d, poder\u00edamos dizer que Artaud prop\u00f5e colocar em xeque a pr\u00f3pria ideia de interpreta\u00e7\u00e3o do mundo, considerando que, para ele, o verdadeiro pensamento \u00e9 aquele que n\u00e3o se reduz \u00e0 reitera\u00e7\u00e3o das categorias pr\u00e9-existentes, tendo em vista que acredita que o pensamento criador nasce nos v\u00e1cuos e nos novos espa\u00e7os e a pr\u00f3pria inquietude humana inaugura na tentativa de compreender a exist\u00eancia. Podemos dizer que Artaud se dissocia dessa heran\u00e7a da filosofia de um pensamento que pensa somente em torno de si mesmo, na medida em que ele prop\u00f5e a uma esp\u00e9cie de n\u00e3o-pensar. Mas esse n\u00e3o-pensar \u00e9 n\u00e3o pensar sobre o pensado e, sim, pensar o n\u00e3o pensado, ou seja, dar voz \u00e0 pr\u00f3pria exist\u00eancia ao esp\u00edrito do ser que n\u00e3o se sente contemplado diante da racionalidade de um mundo conceitual e impostor.<\/h3>\n

Finalmente, levando em conta o momento atual e a pandemia, soa plaus\u00edvel pensar em O Teatro e a Peste<\/em>, um cap\u00edtulo do livro O Teatro e seu Duplo<\/em>, de Antonin Artaud. Neste texto, Artaud se refere \u00e0 peste de 1947, em Floren\u00e7a, e a de 1720, em Marselha. Apesar de acontecimentos de uma certa forma datados, para Artaud, os acontecimentos em si mesmos n\u00e3o s\u00e3o o mais importante. Conforme sua proposta na forma\u00e7\u00e3o do Teatro Alfred Jarry, ele diz:<\/h3>\n

\u201cMas diriam, um teatro t\u00e3o afastado da vida e dos fatos<\/h3>\n

das preocupa\u00e7\u00f5es atuais<\/h3>\n

das preocupa\u00e7\u00f5es e dos acontecimentos<\/h3>\n

no que elas encerram de mais protundo<\/h3>\n

e que \u00e9 o atributo de alguns.<\/h3>\n

Porei em cena acontecimentos e n\u00e3o homens.<\/h3>\n

E ser\u00e1 o assunto escolhido devido \u00e0 sua atualidade<\/h3>\n

e por todas as alus\u00f5es que ele comporta.<\/h3>\n

O que interessa nos acontecimentos atuais<\/h3>\n

n\u00e3o s\u00e3o os acontecimentos em si mesmos,<\/h3>\n

mas o estado de ebuli\u00e7\u00e3o moral<\/h3>\n

no qual eles mergulham o esp\u00edrito dos homens.<\/h3>\n

O grau de tens\u00e3o extrema<\/h3>\n

\u00e9 o estado de caos consciente<\/h3>\n

no qual n\u00e3o cessam de nos envolver.<\/h3>\n

Pois bem, \u00e9 dessa atualidade pat\u00e9tica e m\u00edtica<\/h3>\n

que o teatro se desviou<\/h3>\n

e \u00e9 com justa raz\u00e3o que o p\u00fablico se desinteressa<\/h3>\n

de um teatro que ignora a realidade a esse ponto.\u201d<\/h3>\n

<\/h3>\n

<\/h3>\n

Por isso, faz uma \u00e1cida cr\u00edtica ao teatro convencional, do qual n\u00e3o comunga e at\u00e9 combate e, com Robert Aron e Roger Vitrac, depois de ter rompido com o movimento surrealista de Andr\u00e9 Breton, pronuncia:<\/h3>\n

<\/h3>\n

\u201cO teatro convencional serve aos idiotas<\/h3>\n

loucos<\/h3>\n

invertidos<\/h3>\n

indiv\u00edduos com instru\u00e7\u00e3o prim\u00e1ria<\/h3>\n

e antipoetas positivistas ocidentais,<\/h3>\n

pois este teatro fede e, inacreditalvemente,<\/h3>\n

ao homem provis\u00f3rio<\/h3>\n

material<\/h3>\n

eu diria at\u00e9 que fede<\/h3>\n

a carne putrefata e homem.<\/h3>\n

O teatro tradicional est\u00e1 num adiantado estado<\/h3>\n

de decad\u00eancia.<\/h3>\n

Imita uma sinistra realidade e ao realizar pe\u00e7as<\/h3>\n

est\u00f3rias de interesse humano<\/h3>\n

cenas \u00edntimas das vidas de alguns t\u00edteres converte<\/h3>\n

o p\u00fablico em fantoches e bisbilhoteiros.\u201d<\/h3>\n

<\/h3>\n

Nesse sentido, para Artaud, a peste parece um mal necess\u00e1rio, considerando que para ele, o teatro, assim como a peste, \u00e9 uma condi\u00e7\u00e3o decisiva, ou seja, \u00e9 uma crise que se resolve pela morte ou pela cura. Ele acredita que sob a a\u00e7\u00e3o do flagelo os princ\u00edpios que norteiam a sociedade se desfazem e a ordem at\u00e9 ent\u00e3o acreditada como o melhor dos mundos poss\u00edveis se desmoronam. Como ele afirma em O teatro e a Peste<\/em>:<\/h3>\n

\u201cMesmo destru\u00eddo, mesmo aniquilado e pulverizado organicamente, e queimado em suas entranhas, ele sabe que n\u00e3o se morre nos sonhos, que neles a vontade atua at\u00e9 o absurdo, at\u00e9 a nega\u00e7\u00e3o do poss\u00edvel, at\u00e9 uma esp\u00e9cie de transmuta\u00e7\u00e3o da mentira com a qual se refaz a verdade\u201d.<\/h3>\n

<\/h3>\n

De algum modo, nesse texto, Artaud referenda o teatro para al\u00e9m de uma mera representa\u00e7\u00e3o plat\u00f4nica do mundo, dividido entre o mundo das ideias e o mundo dos sentidos, assim como refuta o manique\u00edsmo que separa o mundo do bem do mundo do mal. Artaud descontr\u00f3i essas fronteiras, assim como, tamb\u00e9m desafaz os discursos apol\u00edneos da arte como a beleza que n\u00e3o passa de um acordo est\u00e9tico. Para ele, o teatro n\u00e3o s\u00f3 \u00e9 uma possibilidade de destrui\u00e7\u00e3o desse mundo conformado com as trag\u00e9dias como se fora meramente um des\u00edgnio dos deuses, mas tamb\u00e9m prop\u00f5e a constru\u00e7\u00e3o de uma nova forma de nos organizarmos a partir do caos que \u00e9 muito mais verdadeiro e honesto com a vida do que os tempos de bonan\u00e7a. Da\u00ed, tira proveito da peste:<\/h3>\n

\u201cA peste toma imagens adormecidas, uma desordem latente e as leva de repente aos gestos mais extremos; o teatro tamb\u00e9m toma gestos e os esgota: assim como a peste, o teatro refaz o elo entre o que \u00e9 e o que n\u00e3o \u00e9, entre a virtualidade do poss\u00edvel e o que existe na natureza materializada. O teatro reencontra a no\u00e7\u00e3o das figuras e dos s\u00edmbolos-tipos, que agem como se fossem pausas, sinais de suspens\u00e3o, paradas card\u00edacas, acessos de humor, acessos inflamat\u00f3rios de imagens em nossas cabe\u00e7as bruscamente despertadas; o teatro nos restitui todos os conflitos em n\u00f3s adormecidos com todas as suas for\u00e7as, e ele d\u00e1 a essas for\u00e7as nomes que saudamos como se fossem s\u00edmbolos: e diante de n\u00f3s trava-se ent\u00e3o uma batalha de s\u00edmbolos, lan\u00e7ados uns contra os outros num pisoteamento imposs\u00edvel; pois s\u00f3 pode haver teatro a partir do momento em que realmente come\u00e7a o imposs\u00edvel e em que a poesia que acontece em cena alimenta e aquece s\u00edmbolos realizados.<\/h3>\n

Esses s\u00edmbolos que s\u00e3o signos de for\u00e7as maduras, mas at\u00e9 ent\u00e3o subjugadas e sem uso na realidade, explodem sob o aspecto de imagens incr\u00edveis que d\u00e3o direito de cidadania e de exist\u00eancia a atos hostis por natureza \u00e0 vida das sociedades.<\/h3>\n

Uma verdadeira pe\u00e7a de teatro perturba o repouso dos sentidos, libera o inconsciente comprimido, leva a uma esp\u00e9cie de revolta virtual e que ali\u00e1s s\u00f3 poder\u00e1 assumir todo o seu valor se permanecer virtual, imp\u00f5e \u00e0s coletividades reunidas uma atitude heroica e dif\u00edcil\u201d.<\/h3>\n

<\/h3>\n

Concluindo, considerando a proposta de falar sobre O Teatro de Artaud \u2013 Entre a Mitologia e a Peste, cabe ressaltar Artaud como um iconoclasta e adepto de um sentido de vida que ainda est\u00e1 para ser conhecido, inclusive, para livr\u00e1-lo da mitologia entendida como a constru\u00e7\u00e3o de um mundo cujos mitos exercem o papel de supera\u00e7\u00e3o das fraquezas humanas, creio que para situ\u00e1-lo no tempo e no espa\u00e7o, est\u00e1 mais para a utopia como o “\u03bf\u03c5”<\/em>\u00a0(n\u00e3o) e “\u03c4\u03bf\u03c0\u03bf\u03c2<\/em>” (lugar), na etimologia grega, o n\u00e3o-lugar, ou seja, um lugar que n\u00e3o existe na realidade.\u00a0Mas para Artaud a utopia \u00e9 o n\u00e3o-lugar que precisa ser constru\u00eddo pelo teatro. N\u00e3o \u00e9 por acaso que ele afirma num de seus textos:<\/h3>\n

\u201c\u00c9 preciso acreditar num sentido renovado<\/h3>\n

pelo teatro<\/h3>\n

onde o homem impavidamente torna-se senhor daquilo<\/h3>\n

que ainda n\u00e3o existe<\/h3>\n

e o faz nascer<\/h3>\n

e tudo que ainda n\u00e3o nasceu vir a nascer<\/h3>\n

contanto que n\u00e3o nos contentamos com ser<\/h3>\n

simples \u00f3rg\u00e3os de registro.<\/h3>\n

<\/h3>\n

 <\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

Resumo: O artigo tem como objetivo contribuir para uma reflex\u00e3o sobre o teatro proposto por Antonin Artaud e sua rela\u00e7\u00e3o com a mitologia e a peste. Se, por um lado, a mitologia pode ser entendida como uma narrativa que explica como o mundo e a humanidade foram constru\u00eddos para a forma que ent\u00e3o conhecemos, conv\u00e9m analisar que em muitos de seus escritos Artaud se manifesta como um verdadeiro iconoclasta, que em sua origem grega eikon (\u00edcone ou imagem) e klastein (quebrar) significa \u201cquebrador de imagem\u201d. Quanto \u00e0 peste Artaud acredita na sua capacidade de instalar a desordem e provocar conflitos para, assim, permitir a revela\u00e7\u00e3o de verdades socialmente insuport\u00e1veis, como propunha em seu \u201cteatro da crueldade\u201d. O TEATRO DE ARTAUD \u2013 ENTRE A MITOLOGIA E A PESTE Wilson Co\u00ealho Se pensarmos a mitologia como uma narrativa que explica como o mundo e a humanidade foram constru\u00eddos para a forma que ent\u00e3o conhecemos, podemos tamb\u00e9m concordar com a ideia de que, na tentativa de entender o significado de sua exist\u00eancia, o ser humano sentiu a necessidade de projetar-se para fora de si mesmo. Assim, a origem do mito pode estar no desejo e na necessidade do ser humano de enfrentar o mundo, bem como, para fugir do medo e inseguran\u00e7a frente \u00e0s for\u00e7as da natureza que at\u00e9 hoje s\u00e3o assustadoras. De certa forma, a cria\u00e7\u00e3o dos mitos tamb\u00e9m pode ser vista como a necessidade de inventar e depositar nos mesmos uma esp\u00e9cie de compensa\u00e7\u00e3o para a fragilidade dos humanos, ao mesmo tempo que lhe d\u00e3o a possibilidade de se acreditarem entendendo ao mundo e a si mesmos, como se fora a possibilidade de se acomodarem e se tranquilizarem perante os mist\u00e9rios da vida. Nesse sentido, a mitologia se sustenta basicamente em dois pilares: a cosmogonia e a teogonia. E, entendendo a cosmogonia como uma tentativa de organiza\u00e7\u00e3o do caos a partir de alguns modelos relacionados \u00e0 exist\u00eancia com origem no cosmos ou no universo. Trata-se de uma especula\u00e7\u00e3o sobre a forma\u00e7\u00e3o do mundo. A teogonia, por sua vez, se d\u00e1 na cria\u00e7\u00e3o de divindades para a representa\u00e7\u00e3o de fen\u00f4menos ou aspectos da natureza, de certa forma, humanizada, para expressar as ideias sobre a constitui\u00e7\u00e3o de regentes para o universo. Havemos de tamb\u00e9m convir que tudo isso passa pela cultura, ou seja, que o universo n\u00e3o se trata de um absoluto, considerando que cada povo se organizou a partir da cria\u00e7\u00e3o de seus pr\u00f3prios universos ou mundos. Assim, existem tantos universos ou mundos quanto existem culturas. Obviamente, muitas delas vem sendo assassinadas a mediante o projeto colonialista e hegem\u00f4nico do mundo ocidental capitalista. Depois, surge a filosofia como uma necessidade de supera\u00e7\u00e3o dos mitos e rompimento com a teodiceia. Nessa tentativa de abandonar e superar a cren\u00e7a m\u00edtica, a filosofia busca a raz\u00e3o e a l\u00f3gica como pressupostos b\u00e1sicos para o pensar. Muito embora n\u00e3o devamos nos esquecer que muitas das \u201cciviliza\u00e7\u00f5es\u201d ou culturas em nosso planeta prop\u00f5em alguns pensamentos filos\u00f3ficos ainda ligados \u00e0 tradi\u00e7\u00e3o religiosa de seus povos. Mas como situar Antonin Artaud nesse contexto? Primeiramente, acredito que o passo fundamental \u00e9 desmitificar o pr\u00f3prio Artaud e traz\u00ea-lo para o plano humano, para que sua obra seja entendida nessa condi\u00e7\u00e3o e n\u00e3o como mito que \u00e9 o espa\u00e7o do inalcan\u00e7\u00e1vel. N\u00e3o que sua obra seja de f\u00e1cil apreens\u00e3o, mas que \u00e9 resultado de uma viv\u00eancia e de experi\u00eancias realizadas dentro de um contexto hist\u00f3rico e que se produziu a partir de uma busca e posicionamento contra a cultura e o pensamento de uma sociedade aprisionada e engessada em conceitos em que predomina um modelo escravagista e tirano em prol de um establishment que, para al\u00e9m do humano, t\u00eam as preocupa\u00e7\u00f5es voltadas para uma\u00a0ordem\u00a0ideol\u00f3gica e \u00a0pol\u00edtica\u00a0que constitui uma elite tanto econ\u00f4mica quanto intelectual atrav\u00e9s do controle de um\u00a0Estado. Nesse sentido de desmitificar Artaud, podemos creditar \u00e0 Florence de M\u00e9redieu um certo pioneirismo desta tarefa, considerando a grande e imprescind\u00edvel obra C\u2019\u00e9tait Antonin Artaud (publicada no Brasil pela Perspectiva sob o t\u00edtulo Eis Antonin Artaud). Com essa edi\u00e7\u00e3o, podemos dizer que a Fran\u00e7a resgata uma d\u00edvida com o escritor, dramaturgo, poeta, missivista, roteirista, encenador, ator de teatro e cinema, figurinista, cen\u00f3grafo, desenhista, pensador e criador do \u201cTeatro da Crueldade\u201d. E, voltando a Artaud, a partir dele mesmo, podemos citar a sua conhecida Carta aos Reitores das Universidades Europeias, onde come\u00e7a dizendo: \u201cNa estreita cisterna que os Senhores chamam de “Pensamento”, os raios espirituais apodrecem como a palha. Chega de jogos de linguagem, de artif\u00edcios da sintaxe, de prestidigita\u00e7\u00f5es com f\u00f3rmulas, agora \u00e9 preciso encontrar a grande Lei do cora\u00e7\u00e3o, a Lei que n\u00e3o seja uma lei, uma pris\u00e3o, mas um guia para o Esp\u00edrito perdido no seu pr\u00f3prio labirinto. Al\u00e9m daquilo que a ci\u00eancia jamais conseguir\u00e1 alcan\u00e7ar, l\u00e1 onde os feixes da raz\u00e3o se partem contra as nuvens, existe esse labirinto, n\u00facleo central para o qual convergem todas as for\u00e7as do ser, as nervuras \u00faltimas do Esp\u00edrito. Nesse d\u00e9dalo de muralhas m\u00f3veis e sempre removidas, fora de todas as formas conhecidas do pensamento, nosso Esp\u00edrito se agita, espreitando seus movimentos mais secretos e espont\u00e2neos, aqueles com um car\u00e1ter de revela\u00e7\u00e3o, essa \u00e1ria vinda de longe, ca\u00edda do c\u00e9u\u201d. Numa outra de suas cartas, consideradas com uma de suas marcas, Artaud escreve Aos Diretores de Asilos de Loucos, e come\u00e7a afirmando que: \u201cAs leis e os costumes, concedem-lhes o direito de medir o esp\u00edrito. Esta jurisdi\u00e7\u00e3o soberana e terr\u00edvel, voc\u00eas a exercem segundo vossos pr\u00f3prios padr\u00f5es de entendimento. N\u00e3o nos fa\u00e7am rir. A credulidade dos povos civilizados, dos especialistas, dos governantes, enfeita a psiquiatria de inexplic\u00e1veis luzes sobrenaturais. A profiss\u00e3o que voc\u00eas exercem est\u00e1 julgada de antem\u00e3o. N\u00e3o pensamos em discutir aqui o valor dessa ci\u00eancia, nem a duvidosa exist\u00eancia das doen\u00e7as mentais. Por\u00e9m para cada cem pretendidas patogenias, onde se desencadeia a confus\u00e3o da mat\u00e9ria e do esp\u00edrito, para cada cem classifica\u00e7\u00f5es, onde as mais vagas s\u00e3o tamb\u00e9m as \u00fanicas utiliz\u00e1veis, quantas tentativas nobres se contam para conseguir melhor compreens\u00e3o do mundo irreal onde vivem aqueles que voc\u00eas encarceraram? Quantos de voc\u00eas, por exemplo, consideram que o sonho do demente precoce ou as imagens que o perseguem s\u00e3o algo mais que uma salada de palavras? N\u00e3o nos surpreende ver at\u00e9 que ponto voc\u00eas est\u00e3o empenhados numa tarefa para a qual s\u00f3 existem alguns poucos predestinados. Por\u00e9m nos rebelamos contra o direito concedido a certos homens \u2013 capazes ou n\u00e3o \u2013 de dar por terminadas suas investiga\u00e7\u00f5es no campo do esp\u00edrito com um veredito de encarceramento perp\u00e9tuo. E termina dizendo: \u201cEsperamos que amanh\u00e3 de manh\u00e3, na hora da visita m\u00e9dica, recordem isto, quando tratarem de conversar sem dicion\u00e1rio com esses homens sobre os quais \u2013 reconhe\u00e7am \u2013 os senhores s\u00f3 t\u00eam a superioridade da for\u00e7a\u201d. Ainda em rela\u00e7\u00e3o ao seu desafio sobre a ideia de sanidade e loucura, Artaud faz o seu desafio: \u201cSenhores! E o que \u00e9 um aut\u00eantico louco? \u00c9 um homem que preferiu enlouquecer no sentido em que a sociedade entende a palavra em vez de trair uma determinada id\u00e9ia superior de honra humana. Assim, a sociedade mandou estrangular nos seus manic\u00f4mios todos aqueles dos quais queria se desembara\u00e7ar ou se defender porque eles se recusavam a ser c\u00famplices em certos atos de suprema sujeira. Pois o louco \u00e9 tamb\u00e9m o homem que a sociedade n\u00e3o quis ouvir e que \u00e9 impedido de enunciar certas verdades insuport\u00e1veis\u201d. Na obra Para acabar com o julgamento de deus (que, inclusive, faz quest\u00e3o de escrever deus com letra min\u00fascula), Artaud se insere contra a mitologia crist\u00e3 via coloniza\u00e7\u00e3o europeia. Num dos trechos dessa obra radiof\u00f4nica ele diz que: \u201cE de onde vem essa obje\u00e7\u00e3o \u00e0 imund\u00edcie? Do fato de que o mundo n\u00e3o \u00e9 ainda constitu\u00eddo, ou de que o homem n\u00e3o tem mais que uma pequena id\u00e9ia do mundo e que ele quer eternamente guardar? Isso vem do que um homem, um belo dia, tem conclu\u00eddo a ideia de mundo. Duas rotas se oferecem a ele essa do infinito exterior essa do \u00ednfimo interior. E ele tem preferido o \u00ednfimo interior. L\u00e1 onde ele n\u00e3o tem que comprimir… o rato a l\u00edngua o \u00e2nus ou a glande. E deus, ele mesmo apressou o movimento. Deus \u00e9 um ser? Se ele \u00e9, \u00e9 merda. Se ele n\u00e3o \u00e9 ele n\u00e3o \u00e9. Ora, ele n\u00e3o \u00e9, mas como o vazio que avan\u00e7a com todas as suas formas\u201d. Uma das quest\u00f5es mais interessantes que podemos notar nessa obra Para acabar com o julgamento de deus, \u00e9 sua preocupa\u00e7\u00e3o com uma cultura que, de alguma forma, ele acreditava estar livre do pensamento ocidental, em especial, o europeu. Trata-se do seu encontro com os Tarahumaras no M\u00e9xico, quando os visitou em 1936. Obviamente, ele se decepcionou em algum sentido, considerando que os mesmos j\u00e1 estavam afetados pelos invasores europeus. E, baseado nisso, regata o Ritual do Tutuguri ou o Rito do Sol Negro, onde coloca em quest\u00e3o o encontro das culturas. E nessa obra ele cria a senten\u00e7a do Corpo Sem \u00d3rg\u00e3os que muita gente tem se debru\u00e7ado em explicar, infelizmente aos olhos da psican\u00e1lise ou da sociologia, perdendo assim a possibilidade de compreender o grito de seu esp\u00edrito em busca de uma po\u00e9tica origin\u00e1ria. Para Artaud, o Corpo Sem \u00d3rg\u00e3os significa submeter o homem a uma cirurgia. Mas n\u00e3o se trata de uma cirurgia medicinal e \u2013 sim \u2013 de uma opera\u00e7\u00e3o ontol\u00f3gica, onde o homem deveria raspar toda a sua carne e recriar-se a partir do seu osso. Limpar-se de todos os desejos constru\u00eddos pelos psicologismos e pelo mito da chamada civiliza\u00e7\u00e3o. Uma aboli\u00e7\u00e3o dos desejos em prol da vontade, daquilo que est\u00e1 em pot\u00eancia nesses seres origin\u00e1rios. De fato, a verdadeira obsess\u00e3o de Artaud \u00e9 a pureza. E, para alcan\u00e7ar essa pureza ele necessita destruir a imund\u00edcie, mas para destru\u00ed-la ele precisa fazer com que ela apare\u00e7a ao dia em toda a sua imensa sujeira, tir\u00e1-la do estado enrustido ou recalcado como instrumento de defesa e traz\u00ea-la \u00e0 tona para despeda\u00e7\u00e1-la. Por isso, muitas vezes, o exerc\u00edcio da obscenidade, da porcaria, espalhando a fecalidade em abund\u00e2ncia. A vontade de Artaud era fazer voar em explos\u00e3o a antiga ordem criada por \u201cdeus\u201d, para reedificar um corpo novo, como assim ele disse em alto e bom som: \u2013 \u201ceu reconstruirei o homem que sou\u201d \u2013 e enfim puro. Mas ele tamb\u00e9m acredita que essa reconstru\u00e7\u00e3o do corpo passa por uma reinven\u00e7\u00e3o da linguagem. As palavras est\u00e3o gastas e organizadas em silogismos de uma l\u00f3gica formal. E nesse sentido ele acredita que o sentido de palavra se d\u00e1 na n\u00e3o-palavra, ou seja, para que a palavra exista, faz-se necess\u00e1rio que a mesma se despoje de s\u00ea-la enquanto tal. Em certo sentido, d\u00e1-se como um existencialismo, considerando que, ao se fazer palavra, a palavra n\u00e3o se sustenta de uma fun\u00e7\u00e3o ou um significado a priori. A palavra \u00e9 uma p\u00e1 que lavra, \u00e9 uma p\u00e1 diante do terreno baldio e desconhecido da exist\u00eancia, onde se cria sulcos para uma tentativa de conhecimento e apreens\u00e3o disso que n\u00e3o sabemos o que \u00e9, desse vir a ser do esp\u00edrito que se manifesta, mesmo atrav\u00e9s de recursos da glossolalia, como, por exemplo, ainda em Pour en finir avec le jugement de dieu (Para acabar com o julgamento de deus): O reche modo to edire di za tan dari do padera coco. \u00a0 \u00a0 Para Artaud, essas glossolalias, ou seja, essas palavras-gritos s\u00e3o os gritos-sopros que certamente surpreender\u00e3o, n\u00e3o como mero espanto, mas como possibilidade de se perceber a pot\u00eancia dos ritmos e a fabulosa riqueza da inven\u00e7\u00e3o sil\u00e1bica, da liberdade do esp\u00edrito para criar e colocar-se no mundo. Mas para se ter essas experi\u00eancias, principalmente, no que se diz respeito ao teatro, Artaud acreditava que seria preciso Acabar com as obras primas, um dos cap\u00edtulos de O Teatro e seu Duplo, pois \u2013 para ele \u2013 de alguma maneira n\u00f3s somos culpados por acreditarmos que o que est\u00e1 escrito ou pintado ou formulado j\u00e1 fosse uma quest\u00e3o esgotada e que n\u00e3o fosse necess\u00e1rio romper com elas e come\u00e7ar de novo. Nesse cap\u00edtulo, Acabar com as obras primas, ele diz que: \u201c\u00c9 preciso acabar com a ideia das obras-primas reservadas a uma assim chamada elite e que a massa n\u00e3o entende; e admitir que n\u00e3o existe, no esp\u00edrito, uma zona reservada, como para as liga\u00e7\u00f5es sexuais clandestinas. As obras-primas do passado s\u00e3o boas para o passado, n\u00e3o para n\u00f3s. Temos o direito de dizer o que foi dito e mesmo o que n\u00e3o foi dito de um modo que seja nosso, imediato, direto, que responda aos modos de sentir atuais e que todo o mundo compreenda.\u201d Artaud acredita que se o povo se desacostumou e n\u00e3o lhe interessa ir ao teatro e consider\u00e1-lo como uma arte inferior e usado meramente como uma sa\u00edda para nossos maus instintos, \u00e9 porque fomos habituados desde a Renascen\u00e7a a pensar no teatro como puramente descritivo, como uma mentira e uma ilus\u00e3o que n\u00e3o faz outra coisa sen\u00e3o tentar narrar a psicologia do nosso tempo. E, da psicologia, ele acredita que ela cumpre o vergonhoso papel de reduzir o desconhecido ao conhecido. Da mesma forma como o teatro vem cumprindo essa tarefa de fazer viver em cena seres plaus\u00edveis, com o espet\u00e1culo de um lado e a plateia do outro, sem o ritual onde todos est\u00e3o inclu\u00eddos. E novamente ele se manifesta iconoclasta, primeiro, com S\u00f3focles: \u201c\u00c9 idiotice censurar a massa por n\u00e3o ter o senso do sublime, quando se confunde o sublime com uma de suas manifesta\u00e7\u00f5es formais que s\u00e3o, ali\u00e1s, e sempre, manifesta\u00e7\u00f5es mortas. E se, por exemplo, a massa de hoje j\u00e1 n\u00e3o compreende \u00c9dipo rei, ouso dizer que a culpa \u00e9 de \u00c9dipo rei e n\u00e3o da massa. Em \u00c9dipo rei h\u00e1 o tema do Incesto e a ideia de que a natureza zomba da moral; e que em algum lugar h\u00e1 for\u00e7as errantes com as quais seria bom tomar cuidado; que se d\u00ea a essas for\u00e7as o nome de destino ou outro qualquer. Al\u00e9m disso, h\u00e1 a presen\u00e7a de uma epidemia de peste que \u00e9 uma encarna\u00e7\u00e3o f\u00edsica dessas for\u00e7as. Mas tudo isso sob disfarces e numa linguagem que perderam qualquer contato com o ritmo epil\u00e9ptico e grosseiro deste tempo. S\u00f3focles talvez fale alto, mas com modos que j\u00e1 n\u00e3o s\u00e3o desta \u00e9poca. Ele fala fino demais para esta \u00e9poca, e parece que ele fala de lado\u201d. E, depois, com o famoso bardo ingl\u00eas: \u201cO pr\u00f3prio Shakespeare \u00e9 respons\u00e1vel por esta aberra\u00e7\u00e3o e degrada\u00e7\u00e3o, por essa ideia desinteressada do teatro que quer que uma representa\u00e7\u00e3o teatral deixe o p\u00fablico intacto, sem que uma imagem lan\u00e7ada provoque qualquer abalo no organismo, imprimindo nele uma marca que n\u00e3o mais se apagar\u00e1. Se em Shakespeare o homem \u00e0s vezes se preocupa com aquilo que o ultrapassa, trata-se sempre, definitivamente, das consequ\u00eancias dessa preocupa\u00e7\u00e3o no homem, isto \u00e9, a psicologia. (…) Se Shakespeare e seus imitadores nos insinuaram atrav\u00e9s dos tempos uma ideia da arte pela arte, com a arte de um lado e a vida do outro, pod\u00edamos ficar tranquilos com a ideia ineficaz e pregui\u00e7osa enquanto a vida l\u00e1 fora se mantinha. Mas agora vemos muito bem os sinais indicadores de que o que nos mantinha vivos j\u00e1 n\u00e3o se mant\u00e9m, de que estamos todos loucos, desesperados e doentes. E eu nos convido a reagir\u201d. No que diz respeito \u00e0 filosofia, tamb\u00e9m parece importante localizar Artaud neste suposto \u201camor \u00e0 sabedoria\u201d. De imediato, podemos afirmar que \u2013 apesar de demonstrar ter lido obras de Plat\u00e3o, Arist\u00f3teles, S\u00f6ren Kierkegaard e alguns outros \u2013 suas grandes influ\u00eancias ou talvez coincid\u00eancia, considerando sua postura de rebeldia contra o institu\u00eddo \u2013 dois fil\u00f3sofos que marcadamente est\u00e3o presente em sua obra s\u00e3o Arthur Schopenhauer e Friedrich Nietsche. De Schopenhauer podemos nos ater em As dores do mundo, quando o fil\u00f3sofo nos apresenta uma s\u00e9rie de reflex\u00f5es sobre a exist\u00eancia, propondo uma nova forma de se pensar a dor e a felicidade, embora essa \u00faltima n\u00e3o seja um tema muito comum ao discurso de Artaud. Mas coincidindo com Artaud, os dois defendem a ideia de que ao contr\u00e1rio do bem, o mal \u00e9 que deve ser considerado positivo, uma vez que somente ele se faz, de fato, sentir. A outra obra de Schopenhauer que tamb\u00e9m nos aproxima de uma an\u00e1lise sobre Artaud, est\u00e1 em O mundo como vontade e representa\u00e7\u00e3o, quando o fil\u00f3sofo afirma a superioridade da vontade em detrimento da raz\u00e3o, inclusive, pela ideia de que toda a vida \u00e9 vontade e que raz\u00e3o serve somente para justific\u00e1-la ou reprimi-la, considerando que toda essa subst\u00e2ncia primordial chamada Vontade se estende a todos os demais seres, concebendo-a, assim, como ess\u00eancia n\u00e3o s\u00f3 do homem, mas do mundo. No caso de Nietsche, independente de outras obras que Artaud tenha lido desse fil\u00f3sofo, podemos nos amparar, levando em conta o tema do teatro, em O Nascimento da Trag\u00e9dia. Mas apesar de supostamente a crueldade de Artaud parecer uma deriva\u00e7\u00e3o da crueldade dionis\u00edaca de Nietsche, em muito eles se diferem. Se, para Nietsche, em O Nascimento da Trag\u00e9dia, os gregos conheceram e sentiram a ang\u00fastia e os horrores da exist\u00eancia a partir de uma perturba\u00e7\u00e3o do homem perante os poderes tit\u00e2nicos da natureza, representados por Moira, Prometeu, \u00c9dipo e tantos outros fazendo aparecer o esp\u00edrito apol\u00edneo como uma possibilidade de reagir em prol da vida, projetando as imagens luminosas sobre essa “parede obscura” que representa “uma vis\u00e3o profunda do horr\u00edvel da natureza\u201d, Artaud as renega para reencontrar o tr\u00e1gico na sua pureza, ou seja, entender a viol\u00eancia como algo que \u00e9 natural. De certa forma, Nietsche diante de Artaud parece apenas ser dial\u00e9tico. Mas o que \u00e9 a dial\u00e9tica sen\u00e3o a busca de uma s\u00edntese da contradi\u00e7\u00e3o de dois lados de uma mesma moeda? Se a dial\u00e9tica \u00e9 a arte do di\u00e1logo, esse somente se realiza dentro de um mesmo plano, ou seja, s\u00f3 consegue entender a diferen\u00e7a entre os iguais. Em termos de filosofia, assim como dizia Karl Marx, que \u201cos fil\u00f3sofos se limitaram a interpretar o mundo de diversas maneiras; o que importa \u00e9 modific\u00e1-lo\u201d, poder\u00edamos dizer que Artaud prop\u00f5e colocar em xeque a pr\u00f3pria ideia de interpreta\u00e7\u00e3o do mundo, considerando que, para ele, o verdadeiro pensamento \u00e9 aquele que n\u00e3o se reduz \u00e0 reitera\u00e7\u00e3o das categorias pr\u00e9-existentes, tendo em vista que acredita que o pensamento criador nasce nos v\u00e1cuos e nos novos espa\u00e7os e a pr\u00f3pria inquietude humana inaugura na tentativa de compreender a exist\u00eancia. Podemos dizer que Artaud se dissocia dessa heran\u00e7a da filosofia de um pensamento que pensa somente em torno de si mesmo, na medida em que ele prop\u00f5e a uma esp\u00e9cie de n\u00e3o-pensar. Mas esse n\u00e3o-pensar \u00e9 n\u00e3o pensar sobre o pensado e, sim, pensar o n\u00e3o pensado, ou seja, dar voz \u00e0 pr\u00f3pria exist\u00eancia ao esp\u00edrito do ser que n\u00e3o se sente contemplado diante da racionalidade de um mundo conceitual e impostor. Finalmente, levando em conta o momento atual e a pandemia, soa plaus\u00edvel pensar em O Teatro e a Peste, um cap\u00edtulo do livro O Teatro e seu Duplo, de Antonin Artaud. Neste texto, Artaud se refere \u00e0 peste de 1947, em Floren\u00e7a, e a de 1720, em Marselha. Apesar de acontecimentos de uma certa forma datados, para Artaud, os acontecimentos em si mesmos n\u00e3o s\u00e3o o mais importante. Conforme sua proposta na forma\u00e7\u00e3o do Teatro Alfred Jarry, ele diz: \u201cMas diriam, um teatro t\u00e3o afastado da vida e dos fatos das preocupa\u00e7\u00f5es atuais das preocupa\u00e7\u00f5es e dos acontecimentos no que elas encerram de mais protundo e que \u00e9 o atributo de alguns. Porei em cena acontecimentos e n\u00e3o homens. E ser\u00e1 o assunto escolhido devido \u00e0 sua atualidade e por todas as alus\u00f5es que ele comporta. O que interessa nos acontecimentos atuais n\u00e3o s\u00e3o os acontecimentos em si mesmos, mas o estado de ebuli\u00e7\u00e3o moral no qual eles mergulham o esp\u00edrito dos homens. O grau de tens\u00e3o extrema \u00e9 o estado de caos consciente no qual n\u00e3o cessam de nos envolver. Pois bem, \u00e9 dessa atualidade pat\u00e9tica e m\u00edtica que o teatro se desviou e \u00e9 com justa raz\u00e3o que o p\u00fablico se desinteressa de um teatro que ignora a realidade a esse ponto.\u201d Por isso, faz uma \u00e1cida cr\u00edtica ao teatro convencional, do qual n\u00e3o comunga e at\u00e9 combate e, com Robert Aron e Roger Vitrac, depois de ter rompido com o movimento surrealista de Andr\u00e9 Breton, pronuncia: \u201cO teatro convencional serve aos idiotas loucos invertidos indiv\u00edduos com instru\u00e7\u00e3o prim\u00e1ria e antipoetas positivistas ocidentais, pois este teatro fede e, inacreditalvemente, ao homem provis\u00f3rio material eu diria at\u00e9 que fede a carne putrefata e homem. O teatro tradicional est\u00e1 num adiantado estado de decad\u00eancia. Imita uma sinistra realidade e ao realizar pe\u00e7as est\u00f3rias de interesse humano cenas \u00edntimas das vidas de alguns t\u00edteres converte o p\u00fablico em fantoches e bisbilhoteiros.\u201d Nesse sentido, para Artaud, a peste parece um mal necess\u00e1rio, considerando que para ele, o teatro, assim como a peste, \u00e9 uma condi\u00e7\u00e3o decisiva, ou seja, \u00e9 uma crise que se resolve pela morte ou pela cura. Ele acredita que sob a a\u00e7\u00e3o do flagelo os princ\u00edpios que norteiam a sociedade se desfazem e a ordem at\u00e9 ent\u00e3o acreditada como o melhor dos mundos poss\u00edveis se desmoronam. Como ele afirma em O teatro e a Peste: \u201cMesmo destru\u00eddo, mesmo aniquilado e pulverizado organicamente, e queimado em suas entranhas, ele sabe que n\u00e3o se morre nos sonhos, que neles a vontade atua at\u00e9 o absurdo, at\u00e9 a nega\u00e7\u00e3o do poss\u00edvel, at\u00e9 uma esp\u00e9cie de transmuta\u00e7\u00e3o da mentira com a qual se refaz a verdade\u201d. De algum modo, nesse texto, Artaud referenda o teatro para al\u00e9m de uma mera representa\u00e7\u00e3o plat\u00f4nica do mundo, dividido entre o mundo das ideias e o mundo dos sentidos, assim como refuta o manique\u00edsmo que separa o mundo do bem do mundo do mal. Artaud descontr\u00f3i essas fronteiras, assim como, tamb\u00e9m desafaz os discursos apol\u00edneos da arte como a beleza que n\u00e3o passa de um acordo est\u00e9tico. Para ele, o teatro n\u00e3o s\u00f3 \u00e9 uma possibilidade de destrui\u00e7\u00e3o desse mundo conformado com as trag\u00e9dias como se fora meramente um des\u00edgnio dos deuses, mas tamb\u00e9m prop\u00f5e a constru\u00e7\u00e3o de uma nova forma de nos organizarmos a partir do caos que \u00e9 muito mais verdadeiro e honesto com a vida do que os tempos de bonan\u00e7a. Da\u00ed, tira proveito da peste: \u201cA peste toma imagens adormecidas, uma desordem latente e as leva de repente aos gestos mais extremos; o teatro tamb\u00e9m toma gestos e os esgota: assim como a peste, o teatro refaz o elo entre o que \u00e9 e o que n\u00e3o \u00e9, entre a virtualidade do poss\u00edvel e o que existe na natureza materializada. O teatro reencontra a no\u00e7\u00e3o das figuras e dos s\u00edmbolos-tipos, que agem como se fossem pausas, sinais de suspens\u00e3o, paradas card\u00edacas, acessos de humor, acessos inflamat\u00f3rios de imagens em nossas cabe\u00e7as bruscamente despertadas; o teatro nos restitui todos os conflitos em n\u00f3s adormecidos com todas as suas for\u00e7as, e ele d\u00e1 a essas for\u00e7as nomes que saudamos como se fossem s\u00edmbolos: e diante de n\u00f3s trava-se ent\u00e3o uma batalha de s\u00edmbolos, lan\u00e7ados uns contra os outros num pisoteamento imposs\u00edvel; pois s\u00f3 pode haver teatro a partir do momento em que realmente come\u00e7a o imposs\u00edvel e em que a poesia que acontece em cena alimenta e aquece s\u00edmbolos realizados. Esses s\u00edmbolos que s\u00e3o signos de for\u00e7as maduras, mas at\u00e9 ent\u00e3o subjugadas e sem uso na realidade, explodem sob o aspecto de imagens incr\u00edveis que d\u00e3o direito de cidadania e de exist\u00eancia a atos hostis por natureza \u00e0 vida das sociedades. Uma verdadeira pe\u00e7a de teatro perturba o repouso dos sentidos, libera o inconsciente comprimido, leva a uma esp\u00e9cie de revolta virtual e que ali\u00e1s s\u00f3 poder\u00e1 assumir todo o seu valor se permanecer virtual, imp\u00f5e \u00e0s coletividades reunidas uma atitude heroica e dif\u00edcil\u201d. Concluindo, considerando a proposta de falar sobre O Teatro de Artaud \u2013 Entre a Mitologia e a Peste, cabe ressaltar Artaud como um iconoclasta e adepto de um sentido de vida que ainda est\u00e1 para ser conhecido, inclusive, para livr\u00e1-lo da mitologia entendida como a constru\u00e7\u00e3o de um mundo cujos mitos exercem o papel de supera\u00e7\u00e3o das fraquezas humanas, creio que para situ\u00e1-lo no tempo e no espa\u00e7o, est\u00e1 mais para a utopia como o “\u03bf\u03c5”\u00a0(n\u00e3o) e “\u03c4\u03bf\u03c0\u03bf\u03c2” (lugar), na etimologia grega, o n\u00e3o-lugar, ou seja, um lugar que n\u00e3o existe na realidade.\u00a0Mas para Artaud a utopia \u00e9 o n\u00e3o-lugar que precisa ser constru\u00eddo pelo teatro. N\u00e3o \u00e9 por acaso que ele afirma num de seus textos: \u201c\u00c9 preciso acreditar num sentido renovado pelo teatro onde o homem impavidamente torna-se senhor daquilo que ainda n\u00e3o existe e o faz nascer e tudo que ainda n\u00e3o nasceu vir a nascer contanto que n\u00e3o nos contentamos com ser simples \u00f3rg\u00e3os de registro.  <\/p>\n","protected":false},"author":37,"featured_media":100468,"comment_status":"closed","ping_status":"open","sticky":false,"template":"","format":"standard","meta":{"_acf_changed":false,"footnotes":""},"categories":[677,102,1603],"tags":[],"acf":[],"yoast_head":"\nO TEATRO DE ARTAUD - ENTRE A MITOLOGIA E A PESTE - Teatro Hoje<\/title>\n<meta name=\"robots\" content=\"index, follow, max-snippet:-1, max-image-preview:large, max-video-preview:-1\" \/>\n<link rel=\"canonical\" href=\"https:\/\/teatrohoje.com.br\/2021\/12\/30\/o-teatro-de-artaud-entre-a-mitologia-e-a-peste\/\" \/>\n<meta property=\"og:locale\" content=\"pt_BR\" \/>\n<meta property=\"og:type\" content=\"article\" \/>\n<meta property=\"og:title\" content=\"O TEATRO DE ARTAUD - ENTRE A MITOLOGIA E A PESTE - Teatro Hoje\" \/>\n<meta property=\"og:description\" content=\"Resumo: O artigo tem como objetivo contribuir para uma reflex\u00e3o sobre o teatro proposto por Antonin Artaud e sua rela\u00e7\u00e3o com a mitologia e a peste. Se, por um lado, a mitologia pode ser entendida como uma narrativa que explica como o mundo e a humanidade foram constru\u00eddos para a forma que ent\u00e3o conhecemos, conv\u00e9m analisar que em muitos de seus escritos Artaud se manifesta como um verdadeiro iconoclasta, que em sua origem grega eikon (\u00edcone ou imagem) e klastein (quebrar) significa \u201cquebrador de imagem\u201d. Quanto \u00e0 peste Artaud acredita na sua capacidade de instalar a desordem e provocar conflitos para, assim, permitir a revela\u00e7\u00e3o de verdades socialmente insuport\u00e1veis, como propunha em seu \u201cteatro da crueldade\u201d. O TEATRO DE ARTAUD \u2013 ENTRE A MITOLOGIA E A PESTE Wilson Co\u00ealho Se pensarmos a mitologia como uma narrativa que explica como o mundo e a humanidade foram constru\u00eddos para a forma que ent\u00e3o conhecemos, podemos tamb\u00e9m concordar com a ideia de que, na tentativa de entender o significado de sua exist\u00eancia, o ser humano sentiu a necessidade de projetar-se para fora de si mesmo. Assim, a origem do mito pode estar no desejo e na necessidade do ser humano de enfrentar o mundo, bem como, para fugir do medo e inseguran\u00e7a frente \u00e0s for\u00e7as da natureza que at\u00e9 hoje s\u00e3o assustadoras. De certa forma, a cria\u00e7\u00e3o dos mitos tamb\u00e9m pode ser vista como a necessidade de inventar e depositar nos mesmos uma esp\u00e9cie de compensa\u00e7\u00e3o para a fragilidade dos humanos, ao mesmo tempo que lhe d\u00e3o a possibilidade de se acreditarem entendendo ao mundo e a si mesmos, como se fora a possibilidade de se acomodarem e se tranquilizarem perante os mist\u00e9rios da vida. Nesse sentido, a mitologia se sustenta basicamente em dois pilares: a cosmogonia e a teogonia. E, entendendo a cosmogonia como uma tentativa de organiza\u00e7\u00e3o do caos a partir de alguns modelos relacionados \u00e0 exist\u00eancia com origem no cosmos ou no universo. Trata-se de uma especula\u00e7\u00e3o sobre a forma\u00e7\u00e3o do mundo. A teogonia, por sua vez, se d\u00e1 na cria\u00e7\u00e3o de divindades para a representa\u00e7\u00e3o de fen\u00f4menos ou aspectos da natureza, de certa forma, humanizada, para expressar as ideias sobre a constitui\u00e7\u00e3o de regentes para o universo. Havemos de tamb\u00e9m convir que tudo isso passa pela cultura, ou seja, que o universo n\u00e3o se trata de um absoluto, considerando que cada povo se organizou a partir da cria\u00e7\u00e3o de seus pr\u00f3prios universos ou mundos. Assim, existem tantos universos ou mundos quanto existem culturas. Obviamente, muitas delas vem sendo assassinadas a mediante o projeto colonialista e hegem\u00f4nico do mundo ocidental capitalista. Depois, surge a filosofia como uma necessidade de supera\u00e7\u00e3o dos mitos e rompimento com a teodiceia. Nessa tentativa de abandonar e superar a cren\u00e7a m\u00edtica, a filosofia busca a raz\u00e3o e a l\u00f3gica como pressupostos b\u00e1sicos para o pensar. Muito embora n\u00e3o devamos nos esquecer que muitas das \u201cciviliza\u00e7\u00f5es\u201d ou culturas em nosso planeta prop\u00f5em alguns pensamentos filos\u00f3ficos ainda ligados \u00e0 tradi\u00e7\u00e3o religiosa de seus povos. Mas como situar Antonin Artaud nesse contexto? Primeiramente, acredito que o passo fundamental \u00e9 desmitificar o pr\u00f3prio Artaud e traz\u00ea-lo para o plano humano, para que sua obra seja entendida nessa condi\u00e7\u00e3o e n\u00e3o como mito que \u00e9 o espa\u00e7o do inalcan\u00e7\u00e1vel. N\u00e3o que sua obra seja de f\u00e1cil apreens\u00e3o, mas que \u00e9 resultado de uma viv\u00eancia e de experi\u00eancias realizadas dentro de um contexto hist\u00f3rico e que se produziu a partir de uma busca e posicionamento contra a cultura e o pensamento de uma sociedade aprisionada e engessada em conceitos em que predomina um modelo escravagista e tirano em prol de um establishment que, para al\u00e9m do humano, t\u00eam as preocupa\u00e7\u00f5es voltadas para uma\u00a0ordem\u00a0ideol\u00f3gica e \u00a0pol\u00edtica\u00a0que constitui uma elite tanto econ\u00f4mica quanto intelectual atrav\u00e9s do controle de um\u00a0Estado. Nesse sentido de desmitificar Artaud, podemos creditar \u00e0 Florence de M\u00e9redieu um certo pioneirismo desta tarefa, considerando a grande e imprescind\u00edvel obra C\u2019\u00e9tait Antonin Artaud (publicada no Brasil pela Perspectiva sob o t\u00edtulo Eis Antonin Artaud). Com essa edi\u00e7\u00e3o, podemos dizer que a Fran\u00e7a resgata uma d\u00edvida com o escritor, dramaturgo, poeta, missivista, roteirista, encenador, ator de teatro e cinema, figurinista, cen\u00f3grafo, desenhista, pensador e criador do \u201cTeatro da Crueldade\u201d. E, voltando a Artaud, a partir dele mesmo, podemos citar a sua conhecida Carta aos Reitores das Universidades Europeias, onde come\u00e7a dizendo: \u201cNa estreita cisterna que os Senhores chamam de “Pensamento”, os raios espirituais apodrecem como a palha. Chega de jogos de linguagem, de artif\u00edcios da sintaxe, de prestidigita\u00e7\u00f5es com f\u00f3rmulas, agora \u00e9 preciso encontrar a grande Lei do cora\u00e7\u00e3o, a Lei que n\u00e3o seja uma lei, uma pris\u00e3o, mas um guia para o Esp\u00edrito perdido no seu pr\u00f3prio labirinto. Al\u00e9m daquilo que a ci\u00eancia jamais conseguir\u00e1 alcan\u00e7ar, l\u00e1 onde os feixes da raz\u00e3o se partem contra as nuvens, existe esse labirinto, n\u00facleo central para o qual convergem todas as for\u00e7as do ser, as nervuras \u00faltimas do Esp\u00edrito. Nesse d\u00e9dalo de muralhas m\u00f3veis e sempre removidas, fora de todas as formas conhecidas do pensamento, nosso Esp\u00edrito se agita, espreitando seus movimentos mais secretos e espont\u00e2neos, aqueles com um car\u00e1ter de revela\u00e7\u00e3o, essa \u00e1ria vinda de longe, ca\u00edda do c\u00e9u\u201d. Numa outra de suas cartas, consideradas com uma de suas marcas, Artaud escreve Aos Diretores de Asilos de Loucos, e come\u00e7a afirmando que: \u201cAs leis e os costumes, concedem-lhes o direito de medir o esp\u00edrito. Esta jurisdi\u00e7\u00e3o soberana e terr\u00edvel, voc\u00eas a exercem segundo vossos pr\u00f3prios padr\u00f5es de entendimento. N\u00e3o nos fa\u00e7am rir. A credulidade dos povos civilizados, dos especialistas, dos governantes, enfeita a psiquiatria de inexplic\u00e1veis luzes sobrenaturais. A profiss\u00e3o que voc\u00eas exercem est\u00e1 julgada de antem\u00e3o. N\u00e3o pensamos em discutir aqui o valor dessa ci\u00eancia, nem a duvidosa exist\u00eancia das doen\u00e7as mentais. Por\u00e9m para cada cem pretendidas patogenias, onde se desencadeia a confus\u00e3o da mat\u00e9ria e do esp\u00edrito, para cada cem classifica\u00e7\u00f5es, onde as mais vagas s\u00e3o tamb\u00e9m as \u00fanicas utiliz\u00e1veis, quantas tentativas nobres se contam para conseguir melhor compreens\u00e3o do mundo irreal onde vivem aqueles que voc\u00eas encarceraram? Quantos de voc\u00eas, por exemplo, consideram que o sonho do demente precoce ou as imagens que o perseguem s\u00e3o algo mais que uma salada de palavras? N\u00e3o nos surpreende ver at\u00e9 que ponto voc\u00eas est\u00e3o empenhados numa tarefa para a qual s\u00f3 existem alguns poucos predestinados. Por\u00e9m nos rebelamos contra o direito concedido a certos homens \u2013 capazes ou n\u00e3o \u2013 de dar por terminadas suas investiga\u00e7\u00f5es no campo do esp\u00edrito com um veredito de encarceramento perp\u00e9tuo. E termina dizendo: \u201cEsperamos que amanh\u00e3 de manh\u00e3, na hora da visita m\u00e9dica, recordem isto, quando tratarem de conversar sem dicion\u00e1rio com esses homens sobre os quais \u2013 reconhe\u00e7am \u2013 os senhores s\u00f3 t\u00eam a superioridade da for\u00e7a\u201d. Ainda em rela\u00e7\u00e3o ao seu desafio sobre a ideia de sanidade e loucura, Artaud faz o seu desafio: \u201cSenhores! E o que \u00e9 um aut\u00eantico louco? \u00c9 um homem que preferiu enlouquecer no sentido em que a sociedade entende a palavra em vez de trair uma determinada id\u00e9ia superior de honra humana. Assim, a sociedade mandou estrangular nos seus manic\u00f4mios todos aqueles dos quais queria se desembara\u00e7ar ou se defender porque eles se recusavam a ser c\u00famplices em certos atos de suprema sujeira. Pois o louco \u00e9 tamb\u00e9m o homem que a sociedade n\u00e3o quis ouvir e que \u00e9 impedido de enunciar certas verdades insuport\u00e1veis\u201d. Na obra Para acabar com o julgamento de deus (que, inclusive, faz quest\u00e3o de escrever deus com letra min\u00fascula), Artaud se insere contra a mitologia crist\u00e3 via coloniza\u00e7\u00e3o europeia. Num dos trechos dessa obra radiof\u00f4nica ele diz que: \u201cE de onde vem essa obje\u00e7\u00e3o \u00e0 imund\u00edcie? Do fato de que o mundo n\u00e3o \u00e9 ainda constitu\u00eddo, ou de que o homem n\u00e3o tem mais que uma pequena id\u00e9ia do mundo e que ele quer eternamente guardar? Isso vem do que um homem, um belo dia, tem conclu\u00eddo a ideia de mundo. Duas rotas se oferecem a ele essa do infinito exterior essa do \u00ednfimo interior. E ele tem preferido o \u00ednfimo interior. L\u00e1 onde ele n\u00e3o tem que comprimir… o rato a l\u00edngua o \u00e2nus ou a glande. E deus, ele mesmo apressou o movimento. Deus \u00e9 um ser? Se ele \u00e9, \u00e9 merda. Se ele n\u00e3o \u00e9 ele n\u00e3o \u00e9. Ora, ele n\u00e3o \u00e9, mas como o vazio que avan\u00e7a com todas as suas formas\u201d. Uma das quest\u00f5es mais interessantes que podemos notar nessa obra Para acabar com o julgamento de deus, \u00e9 sua preocupa\u00e7\u00e3o com uma cultura que, de alguma forma, ele acreditava estar livre do pensamento ocidental, em especial, o europeu. Trata-se do seu encontro com os Tarahumaras no M\u00e9xico, quando os visitou em 1936. Obviamente, ele se decepcionou em algum sentido, considerando que os mesmos j\u00e1 estavam afetados pelos invasores europeus. E, baseado nisso, regata o Ritual do Tutuguri ou o Rito do Sol Negro, onde coloca em quest\u00e3o o encontro das culturas. E nessa obra ele cria a senten\u00e7a do Corpo Sem \u00d3rg\u00e3os que muita gente tem se debru\u00e7ado em explicar, infelizmente aos olhos da psican\u00e1lise ou da sociologia, perdendo assim a possibilidade de compreender o grito de seu esp\u00edrito em busca de uma po\u00e9tica origin\u00e1ria. Para Artaud, o Corpo Sem \u00d3rg\u00e3os significa submeter o homem a uma cirurgia. Mas n\u00e3o se trata de uma cirurgia medicinal e \u2013 sim \u2013 de uma opera\u00e7\u00e3o ontol\u00f3gica, onde o homem deveria raspar toda a sua carne e recriar-se a partir do seu osso. Limpar-se de todos os desejos constru\u00eddos pelos psicologismos e pelo mito da chamada civiliza\u00e7\u00e3o. Uma aboli\u00e7\u00e3o dos desejos em prol da vontade, daquilo que est\u00e1 em pot\u00eancia nesses seres origin\u00e1rios. De fato, a verdadeira obsess\u00e3o de Artaud \u00e9 a pureza. E, para alcan\u00e7ar essa pureza ele necessita destruir a imund\u00edcie, mas para destru\u00ed-la ele precisa fazer com que ela apare\u00e7a ao dia em toda a sua imensa sujeira, tir\u00e1-la do estado enrustido ou recalcado como instrumento de defesa e traz\u00ea-la \u00e0 tona para despeda\u00e7\u00e1-la. Por isso, muitas vezes, o exerc\u00edcio da obscenidade, da porcaria, espalhando a fecalidade em abund\u00e2ncia. A vontade de Artaud era fazer voar em explos\u00e3o a antiga ordem criada por \u201cdeus\u201d, para reedificar um corpo novo, como assim ele disse em alto e bom som: \u2013 \u201ceu reconstruirei o homem que sou\u201d \u2013 e enfim puro. Mas ele tamb\u00e9m acredita que essa reconstru\u00e7\u00e3o do corpo passa por uma reinven\u00e7\u00e3o da linguagem. As palavras est\u00e3o gastas e organizadas em silogismos de uma l\u00f3gica formal. E nesse sentido ele acredita que o sentido de palavra se d\u00e1 na n\u00e3o-palavra, ou seja, para que a palavra exista, faz-se necess\u00e1rio que a mesma se despoje de s\u00ea-la enquanto tal. Em certo sentido, d\u00e1-se como um existencialismo, considerando que, ao se fazer palavra, a palavra n\u00e3o se sustenta de uma fun\u00e7\u00e3o ou um significado a priori. A palavra \u00e9 uma p\u00e1 que lavra, \u00e9 uma p\u00e1 diante do terreno baldio e desconhecido da exist\u00eancia, onde se cria sulcos para uma tentativa de conhecimento e apreens\u00e3o disso que n\u00e3o sabemos o que \u00e9, desse vir a ser do esp\u00edrito que se manifesta, mesmo atrav\u00e9s de recursos da glossolalia, como, por exemplo, ainda em Pour en finir avec le jugement de dieu (Para acabar com o julgamento de deus): O reche modo to edire di za tan dari do padera coco. \u00a0 \u00a0 Para Artaud, essas glossolalias, ou seja, essas palavras-gritos s\u00e3o os gritos-sopros que certamente surpreender\u00e3o, n\u00e3o como mero espanto, mas como possibilidade de se perceber a pot\u00eancia dos ritmos e a fabulosa riqueza da inven\u00e7\u00e3o sil\u00e1bica, da liberdade do esp\u00edrito para criar e colocar-se no mundo. Mas para se ter essas experi\u00eancias, principalmente, no que se diz respeito ao teatro, Artaud acreditava que seria preciso Acabar com as obras primas, um dos cap\u00edtulos de O Teatro e seu Duplo, pois \u2013 para ele \u2013 de alguma maneira n\u00f3s somos culpados por acreditarmos que o que est\u00e1 escrito ou pintado ou formulado j\u00e1 fosse uma quest\u00e3o esgotada e que n\u00e3o fosse necess\u00e1rio romper com elas e come\u00e7ar de novo. Nesse cap\u00edtulo, Acabar com as obras primas, ele diz que: \u201c\u00c9 preciso acabar com a ideia das obras-primas reservadas a uma assim chamada elite e que a massa n\u00e3o entende; e admitir que n\u00e3o existe, no esp\u00edrito, uma zona reservada, como para as liga\u00e7\u00f5es sexuais clandestinas. As obras-primas do passado s\u00e3o boas para o passado, n\u00e3o para n\u00f3s. Temos o direito de dizer o que foi dito e mesmo o que n\u00e3o foi dito de um modo que seja nosso, imediato, direto, que responda aos modos de sentir atuais e que todo o mundo compreenda.\u201d Artaud acredita que se o povo se desacostumou e n\u00e3o lhe interessa ir ao teatro e consider\u00e1-lo como uma arte inferior e usado meramente como uma sa\u00edda para nossos maus instintos, \u00e9 porque fomos habituados desde a Renascen\u00e7a a pensar no teatro como puramente descritivo, como uma mentira e uma ilus\u00e3o que n\u00e3o faz outra coisa sen\u00e3o tentar narrar a psicologia do nosso tempo. E, da psicologia, ele acredita que ela cumpre o vergonhoso papel de reduzir o desconhecido ao conhecido. Da mesma forma como o teatro vem cumprindo essa tarefa de fazer viver em cena seres plaus\u00edveis, com o espet\u00e1culo de um lado e a plateia do outro, sem o ritual onde todos est\u00e3o inclu\u00eddos. E novamente ele se manifesta iconoclasta, primeiro, com S\u00f3focles: \u201c\u00c9 idiotice censurar a massa por n\u00e3o ter o senso do sublime, quando se confunde o sublime com uma de suas manifesta\u00e7\u00f5es formais que s\u00e3o, ali\u00e1s, e sempre, manifesta\u00e7\u00f5es mortas. E se, por exemplo, a massa de hoje j\u00e1 n\u00e3o compreende \u00c9dipo rei, ouso dizer que a culpa \u00e9 de \u00c9dipo rei e n\u00e3o da massa. Em \u00c9dipo rei h\u00e1 o tema do Incesto e a ideia de que a natureza zomba da moral; e que em algum lugar h\u00e1 for\u00e7as errantes com as quais seria bom tomar cuidado; que se d\u00ea a essas for\u00e7as o nome de destino ou outro qualquer. Al\u00e9m disso, h\u00e1 a presen\u00e7a de uma epidemia de peste que \u00e9 uma encarna\u00e7\u00e3o f\u00edsica dessas for\u00e7as. Mas tudo isso sob disfarces e numa linguagem que perderam qualquer contato com o ritmo epil\u00e9ptico e grosseiro deste tempo. S\u00f3focles talvez fale alto, mas com modos que j\u00e1 n\u00e3o s\u00e3o desta \u00e9poca. Ele fala fino demais para esta \u00e9poca, e parece que ele fala de lado\u201d. E, depois, com o famoso bardo ingl\u00eas: \u201cO pr\u00f3prio Shakespeare \u00e9 respons\u00e1vel por esta aberra\u00e7\u00e3o e degrada\u00e7\u00e3o, por essa ideia desinteressada do teatro que quer que uma representa\u00e7\u00e3o teatral deixe o p\u00fablico intacto, sem que uma imagem lan\u00e7ada provoque qualquer abalo no organismo, imprimindo nele uma marca que n\u00e3o mais se apagar\u00e1. Se em Shakespeare o homem \u00e0s vezes se preocupa com aquilo que o ultrapassa, trata-se sempre, definitivamente, das consequ\u00eancias dessa preocupa\u00e7\u00e3o no homem, isto \u00e9, a psicologia. (…) Se Shakespeare e seus imitadores nos insinuaram atrav\u00e9s dos tempos uma ideia da arte pela arte, com a arte de um lado e a vida do outro, pod\u00edamos ficar tranquilos com a ideia ineficaz e pregui\u00e7osa enquanto a vida l\u00e1 fora se mantinha. Mas agora vemos muito bem os sinais indicadores de que o que nos mantinha vivos j\u00e1 n\u00e3o se mant\u00e9m, de que estamos todos loucos, desesperados e doentes. E eu nos convido a reagir\u201d. No que diz respeito \u00e0 filosofia, tamb\u00e9m parece importante localizar Artaud neste suposto \u201camor \u00e0 sabedoria\u201d. De imediato, podemos afirmar que \u2013 apesar de demonstrar ter lido obras de Plat\u00e3o, Arist\u00f3teles, S\u00f6ren Kierkegaard e alguns outros \u2013 suas grandes influ\u00eancias ou talvez coincid\u00eancia, considerando sua postura de rebeldia contra o institu\u00eddo \u2013 dois fil\u00f3sofos que marcadamente est\u00e3o presente em sua obra s\u00e3o Arthur Schopenhauer e Friedrich Nietsche. De Schopenhauer podemos nos ater em As dores do mundo, quando o fil\u00f3sofo nos apresenta uma s\u00e9rie de reflex\u00f5es sobre a exist\u00eancia, propondo uma nova forma de se pensar a dor e a felicidade, embora essa \u00faltima n\u00e3o seja um tema muito comum ao discurso de Artaud. Mas coincidindo com Artaud, os dois defendem a ideia de que ao contr\u00e1rio do bem, o mal \u00e9 que deve ser considerado positivo, uma vez que somente ele se faz, de fato, sentir. A outra obra de Schopenhauer que tamb\u00e9m nos aproxima de uma an\u00e1lise sobre Artaud, est\u00e1 em O mundo como vontade e representa\u00e7\u00e3o, quando o fil\u00f3sofo afirma a superioridade da vontade em detrimento da raz\u00e3o, inclusive, pela ideia de que toda a vida \u00e9 vontade e que raz\u00e3o serve somente para justific\u00e1-la ou reprimi-la, considerando que toda essa subst\u00e2ncia primordial chamada Vontade se estende a todos os demais seres, concebendo-a, assim, como ess\u00eancia n\u00e3o s\u00f3 do homem, mas do mundo. No caso de Nietsche, independente de outras obras que Artaud tenha lido desse fil\u00f3sofo, podemos nos amparar, levando em conta o tema do teatro, em O Nascimento da Trag\u00e9dia. Mas apesar de supostamente a crueldade de Artaud parecer uma deriva\u00e7\u00e3o da crueldade dionis\u00edaca de Nietsche, em muito eles se diferem. Se, para Nietsche, em O Nascimento da Trag\u00e9dia, os gregos conheceram e sentiram a ang\u00fastia e os horrores da exist\u00eancia a partir de uma perturba\u00e7\u00e3o do homem perante os poderes tit\u00e2nicos da natureza, representados por Moira, Prometeu, \u00c9dipo e tantos outros fazendo aparecer o esp\u00edrito apol\u00edneo como uma possibilidade de reagir em prol da vida, projetando as imagens luminosas sobre essa “parede obscura” que representa “uma vis\u00e3o profunda do horr\u00edvel da natureza\u201d, Artaud as renega para reencontrar o tr\u00e1gico na sua pureza, ou seja, entender a viol\u00eancia como algo que \u00e9 natural. De certa forma, Nietsche diante de Artaud parece apenas ser dial\u00e9tico. Mas o que \u00e9 a dial\u00e9tica sen\u00e3o a busca de uma s\u00edntese da contradi\u00e7\u00e3o de dois lados de uma mesma moeda? Se a dial\u00e9tica \u00e9 a arte do di\u00e1logo, esse somente se realiza dentro de um mesmo plano, ou seja, s\u00f3 consegue entender a diferen\u00e7a entre os iguais. Em termos de filosofia, assim como dizia Karl Marx, que \u201cos fil\u00f3sofos se limitaram a interpretar o mundo de diversas maneiras; o que importa \u00e9 modific\u00e1-lo\u201d, poder\u00edamos dizer que Artaud prop\u00f5e colocar em xeque a pr\u00f3pria ideia de interpreta\u00e7\u00e3o do mundo, considerando que, para ele, o verdadeiro pensamento \u00e9 aquele que n\u00e3o se reduz \u00e0 reitera\u00e7\u00e3o das categorias pr\u00e9-existentes, tendo em vista que acredita que o pensamento criador nasce nos v\u00e1cuos e nos novos espa\u00e7os e a pr\u00f3pria inquietude humana inaugura na tentativa de compreender a exist\u00eancia. Podemos dizer que Artaud se dissocia dessa heran\u00e7a da filosofia de um pensamento que pensa somente em torno de si mesmo, na medida em que ele prop\u00f5e a uma esp\u00e9cie de n\u00e3o-pensar. Mas esse n\u00e3o-pensar \u00e9 n\u00e3o pensar sobre o pensado e, sim, pensar o n\u00e3o pensado, ou seja, dar voz \u00e0 pr\u00f3pria exist\u00eancia ao esp\u00edrito do ser que n\u00e3o se sente contemplado diante da racionalidade de um mundo conceitual e impostor. Finalmente, levando em conta o momento atual e a pandemia, soa plaus\u00edvel pensar em O Teatro e a Peste, um cap\u00edtulo do livro O Teatro e seu Duplo, de Antonin Artaud. Neste texto, Artaud se refere \u00e0 peste de 1947, em Floren\u00e7a, e a de 1720, em Marselha. Apesar de acontecimentos de uma certa forma datados, para Artaud, os acontecimentos em si mesmos n\u00e3o s\u00e3o o mais importante. Conforme sua proposta na forma\u00e7\u00e3o do Teatro Alfred Jarry, ele diz: \u201cMas diriam, um teatro t\u00e3o afastado da vida e dos fatos das preocupa\u00e7\u00f5es atuais das preocupa\u00e7\u00f5es e dos acontecimentos no que elas encerram de mais protundo e que \u00e9 o atributo de alguns. Porei em cena acontecimentos e n\u00e3o homens. E ser\u00e1 o assunto escolhido devido \u00e0 sua atualidade e por todas as alus\u00f5es que ele comporta. O que interessa nos acontecimentos atuais n\u00e3o s\u00e3o os acontecimentos em si mesmos, mas o estado de ebuli\u00e7\u00e3o moral no qual eles mergulham o esp\u00edrito dos homens. O grau de tens\u00e3o extrema \u00e9 o estado de caos consciente no qual n\u00e3o cessam de nos envolver. Pois bem, \u00e9 dessa atualidade pat\u00e9tica e m\u00edtica que o teatro se desviou e \u00e9 com justa raz\u00e3o que o p\u00fablico se desinteressa de um teatro que ignora a realidade a esse ponto.\u201d Por isso, faz uma \u00e1cida cr\u00edtica ao teatro convencional, do qual n\u00e3o comunga e at\u00e9 combate e, com Robert Aron e Roger Vitrac, depois de ter rompido com o movimento surrealista de Andr\u00e9 Breton, pronuncia: \u201cO teatro convencional serve aos idiotas loucos invertidos indiv\u00edduos com instru\u00e7\u00e3o prim\u00e1ria e antipoetas positivistas ocidentais, pois este teatro fede e, inacreditalvemente, ao homem provis\u00f3rio material eu diria at\u00e9 que fede a carne putrefata e homem. O teatro tradicional est\u00e1 num adiantado estado de decad\u00eancia. Imita uma sinistra realidade e ao realizar pe\u00e7as est\u00f3rias de interesse humano cenas \u00edntimas das vidas de alguns t\u00edteres converte o p\u00fablico em fantoches e bisbilhoteiros.\u201d Nesse sentido, para Artaud, a peste parece um mal necess\u00e1rio, considerando que para ele, o teatro, assim como a peste, \u00e9 uma condi\u00e7\u00e3o decisiva, ou seja, \u00e9 uma crise que se resolve pela morte ou pela cura. Ele acredita que sob a a\u00e7\u00e3o do flagelo os princ\u00edpios que norteiam a sociedade se desfazem e a ordem at\u00e9 ent\u00e3o acreditada como o melhor dos mundos poss\u00edveis se desmoronam. Como ele afirma em O teatro e a Peste: \u201cMesmo destru\u00eddo, mesmo aniquilado e pulverizado organicamente, e queimado em suas entranhas, ele sabe que n\u00e3o se morre nos sonhos, que neles a vontade atua at\u00e9 o absurdo, at\u00e9 a nega\u00e7\u00e3o do poss\u00edvel, at\u00e9 uma esp\u00e9cie de transmuta\u00e7\u00e3o da mentira com a qual se refaz a verdade\u201d. De algum modo, nesse texto, Artaud referenda o teatro para al\u00e9m de uma mera representa\u00e7\u00e3o plat\u00f4nica do mundo, dividido entre o mundo das ideias e o mundo dos sentidos, assim como refuta o manique\u00edsmo que separa o mundo do bem do mundo do mal. Artaud descontr\u00f3i essas fronteiras, assim como, tamb\u00e9m desafaz os discursos apol\u00edneos da arte como a beleza que n\u00e3o passa de um acordo est\u00e9tico. Para ele, o teatro n\u00e3o s\u00f3 \u00e9 uma possibilidade de destrui\u00e7\u00e3o desse mundo conformado com as trag\u00e9dias como se fora meramente um des\u00edgnio dos deuses, mas tamb\u00e9m prop\u00f5e a constru\u00e7\u00e3o de uma nova forma de nos organizarmos a partir do caos que \u00e9 muito mais verdadeiro e honesto com a vida do que os tempos de bonan\u00e7a. Da\u00ed, tira proveito da peste: \u201cA peste toma imagens adormecidas, uma desordem latente e as leva de repente aos gestos mais extremos; o teatro tamb\u00e9m toma gestos e os esgota: assim como a peste, o teatro refaz o elo entre o que \u00e9 e o que n\u00e3o \u00e9, entre a virtualidade do poss\u00edvel e o que existe na natureza materializada. O teatro reencontra a no\u00e7\u00e3o das figuras e dos s\u00edmbolos-tipos, que agem como se fossem pausas, sinais de suspens\u00e3o, paradas card\u00edacas, acessos de humor, acessos inflamat\u00f3rios de imagens em nossas cabe\u00e7as bruscamente despertadas; o teatro nos restitui todos os conflitos em n\u00f3s adormecidos com todas as suas for\u00e7as, e ele d\u00e1 a essas for\u00e7as nomes que saudamos como se fossem s\u00edmbolos: e diante de n\u00f3s trava-se ent\u00e3o uma batalha de s\u00edmbolos, lan\u00e7ados uns contra os outros num pisoteamento imposs\u00edvel; pois s\u00f3 pode haver teatro a partir do momento em que realmente come\u00e7a o imposs\u00edvel e em que a poesia que acontece em cena alimenta e aquece s\u00edmbolos realizados. Esses s\u00edmbolos que s\u00e3o signos de for\u00e7as maduras, mas at\u00e9 ent\u00e3o subjugadas e sem uso na realidade, explodem sob o aspecto de imagens incr\u00edveis que d\u00e3o direito de cidadania e de exist\u00eancia a atos hostis por natureza \u00e0 vida das sociedades. Uma verdadeira pe\u00e7a de teatro perturba o repouso dos sentidos, libera o inconsciente comprimido, leva a uma esp\u00e9cie de revolta virtual e que ali\u00e1s s\u00f3 poder\u00e1 assumir todo o seu valor se permanecer virtual, imp\u00f5e \u00e0s coletividades reunidas uma atitude heroica e dif\u00edcil\u201d. Concluindo, considerando a proposta de falar sobre O Teatro de Artaud \u2013 Entre a Mitologia e a Peste, cabe ressaltar Artaud como um iconoclasta e adepto de um sentido de vida que ainda est\u00e1 para ser conhecido, inclusive, para livr\u00e1-lo da mitologia entendida como a constru\u00e7\u00e3o de um mundo cujos mitos exercem o papel de supera\u00e7\u00e3o das fraquezas humanas, creio que para situ\u00e1-lo no tempo e no espa\u00e7o, est\u00e1 mais para a utopia como o “\u03bf\u03c5”\u00a0(n\u00e3o) e “\u03c4\u03bf\u03c0\u03bf\u03c2” (lugar), na etimologia grega, o n\u00e3o-lugar, ou seja, um lugar que n\u00e3o existe na realidade.\u00a0Mas para Artaud a utopia \u00e9 o n\u00e3o-lugar que precisa ser constru\u00eddo pelo teatro. N\u00e3o \u00e9 por acaso que ele afirma num de seus textos: \u201c\u00c9 preciso acreditar num sentido renovado pelo teatro onde o homem impavidamente torna-se senhor daquilo que ainda n\u00e3o existe e o faz nascer e tudo que ainda n\u00e3o nasceu vir a nascer contanto que n\u00e3o nos contentamos com ser simples \u00f3rg\u00e3os de registro.  \" \/>\n<meta property=\"og:url\" content=\"https:\/\/teatrohoje.com.br\/2021\/12\/30\/o-teatro-de-artaud-entre-a-mitologia-e-a-peste\/\" \/>\n<meta property=\"og:site_name\" content=\"Teatro Hoje\" \/>\n<meta property=\"article:publisher\" content=\"https:\/\/www.facebook.com\/TeatroHoje\/\" \/>\n<meta property=\"article:published_time\" content=\"2021-12-30T15:36:19+00:00\" \/>\n<meta property=\"article:modified_time\" content=\"2022-06-13T12:14:38+00:00\" \/>\n<meta property=\"og:image\" content=\"https:\/\/teatrohoje.com.br\/wp-content\/uploads\/2021\/12\/Antonin-Artaud.jpg\" \/>\n\t<meta property=\"og:image:width\" content=\"512\" \/>\n\t<meta property=\"og:image:height\" content=\"336\" \/>\n\t<meta property=\"og:image:type\" content=\"image\/jpeg\" \/>\n<meta name=\"author\" content=\"Wilson Co\u00ealho\" \/>\n<meta name=\"twitter:card\" content=\"summary_large_image\" \/>\n<meta name=\"twitter:label1\" content=\"Escrito por\" \/>\n\t<meta name=\"twitter:data1\" content=\"Wilson Co\u00ealho\" \/>\n\t<meta name=\"twitter:label2\" content=\"Est. tempo de leitura\" \/>\n\t<meta name=\"twitter:data2\" content=\"24 minutos\" \/>\n<script type=\"application\/ld+json\" class=\"yoast-schema-graph\">{\"@context\":\"https:\/\/schema.org\",\"@graph\":[{\"@type\":\"WebPage\",\"@id\":\"https:\/\/teatrohoje.com.br\/2021\/12\/30\/o-teatro-de-artaud-entre-a-mitologia-e-a-peste\/\",\"url\":\"https:\/\/teatrohoje.com.br\/2021\/12\/30\/o-teatro-de-artaud-entre-a-mitologia-e-a-peste\/\",\"name\":\"O TEATRO DE ARTAUD - 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Se, por um lado, a mitologia pode ser entendida como uma narrativa que explica como o mundo e a humanidade foram constru\u00eddos para a forma que ent\u00e3o conhecemos, conv\u00e9m analisar que em muitos de seus escritos Artaud se manifesta como um verdadeiro iconoclasta, que em sua origem grega eikon (\u00edcone ou imagem) e klastein (quebrar) significa \u201cquebrador de imagem\u201d. Quanto \u00e0 peste Artaud acredita na sua capacidade de instalar a desordem e provocar conflitos para, assim, permitir a revela\u00e7\u00e3o de verdades socialmente insuport\u00e1veis, como propunha em seu \u201cteatro da crueldade\u201d. O TEATRO DE ARTAUD \u2013 ENTRE A MITOLOGIA E A PESTE Wilson Co\u00ealho Se pensarmos a mitologia como uma narrativa que explica como o mundo e a humanidade foram constru\u00eddos para a forma que ent\u00e3o conhecemos, podemos tamb\u00e9m concordar com a ideia de que, na tentativa de entender o significado de sua exist\u00eancia, o ser humano sentiu a necessidade de projetar-se para fora de si mesmo. Assim, a origem do mito pode estar no desejo e na necessidade do ser humano de enfrentar o mundo, bem como, para fugir do medo e inseguran\u00e7a frente \u00e0s for\u00e7as da natureza que at\u00e9 hoje s\u00e3o assustadoras. De certa forma, a cria\u00e7\u00e3o dos mitos tamb\u00e9m pode ser vista como a necessidade de inventar e depositar nos mesmos uma esp\u00e9cie de compensa\u00e7\u00e3o para a fragilidade dos humanos, ao mesmo tempo que lhe d\u00e3o a possibilidade de se acreditarem entendendo ao mundo e a si mesmos, como se fora a possibilidade de se acomodarem e se tranquilizarem perante os mist\u00e9rios da vida. Nesse sentido, a mitologia se sustenta basicamente em dois pilares: a cosmogonia e a teogonia. E, entendendo a cosmogonia como uma tentativa de organiza\u00e7\u00e3o do caos a partir de alguns modelos relacionados \u00e0 exist\u00eancia com origem no cosmos ou no universo. Trata-se de uma especula\u00e7\u00e3o sobre a forma\u00e7\u00e3o do mundo. A teogonia, por sua vez, se d\u00e1 na cria\u00e7\u00e3o de divindades para a representa\u00e7\u00e3o de fen\u00f4menos ou aspectos da natureza, de certa forma, humanizada, para expressar as ideias sobre a constitui\u00e7\u00e3o de regentes para o universo. Havemos de tamb\u00e9m convir que tudo isso passa pela cultura, ou seja, que o universo n\u00e3o se trata de um absoluto, considerando que cada povo se organizou a partir da cria\u00e7\u00e3o de seus pr\u00f3prios universos ou mundos. Assim, existem tantos universos ou mundos quanto existem culturas. Obviamente, muitas delas vem sendo assassinadas a mediante o projeto colonialista e hegem\u00f4nico do mundo ocidental capitalista. Depois, surge a filosofia como uma necessidade de supera\u00e7\u00e3o dos mitos e rompimento com a teodiceia. Nessa tentativa de abandonar e superar a cren\u00e7a m\u00edtica, a filosofia busca a raz\u00e3o e a l\u00f3gica como pressupostos b\u00e1sicos para o pensar. Muito embora n\u00e3o devamos nos esquecer que muitas das \u201cciviliza\u00e7\u00f5es\u201d ou culturas em nosso planeta prop\u00f5em alguns pensamentos filos\u00f3ficos ainda ligados \u00e0 tradi\u00e7\u00e3o religiosa de seus povos. Mas como situar Antonin Artaud nesse contexto? Primeiramente, acredito que o passo fundamental \u00e9 desmitificar o pr\u00f3prio Artaud e traz\u00ea-lo para o plano humano, para que sua obra seja entendida nessa condi\u00e7\u00e3o e n\u00e3o como mito que \u00e9 o espa\u00e7o do inalcan\u00e7\u00e1vel. N\u00e3o que sua obra seja de f\u00e1cil apreens\u00e3o, mas que \u00e9 resultado de uma viv\u00eancia e de experi\u00eancias realizadas dentro de um contexto hist\u00f3rico e que se produziu a partir de uma busca e posicionamento contra a cultura e o pensamento de uma sociedade aprisionada e engessada em conceitos em que predomina um modelo escravagista e tirano em prol de um establishment que, para al\u00e9m do humano, t\u00eam as preocupa\u00e7\u00f5es voltadas para uma\u00a0ordem\u00a0ideol\u00f3gica e \u00a0pol\u00edtica\u00a0que constitui uma elite tanto econ\u00f4mica quanto intelectual atrav\u00e9s do controle de um\u00a0Estado. Nesse sentido de desmitificar Artaud, podemos creditar \u00e0 Florence de M\u00e9redieu um certo pioneirismo desta tarefa, considerando a grande e imprescind\u00edvel obra C\u2019\u00e9tait Antonin Artaud (publicada no Brasil pela Perspectiva sob o t\u00edtulo Eis Antonin Artaud). Com essa edi\u00e7\u00e3o, podemos dizer que a Fran\u00e7a resgata uma d\u00edvida com o escritor, dramaturgo, poeta, missivista, roteirista, encenador, ator de teatro e cinema, figurinista, cen\u00f3grafo, desenhista, pensador e criador do \u201cTeatro da Crueldade\u201d. E, voltando a Artaud, a partir dele mesmo, podemos citar a sua conhecida Carta aos Reitores das Universidades Europeias, onde come\u00e7a dizendo: \u201cNa estreita cisterna que os Senhores chamam de “Pensamento”, os raios espirituais apodrecem como a palha. Chega de jogos de linguagem, de artif\u00edcios da sintaxe, de prestidigita\u00e7\u00f5es com f\u00f3rmulas, agora \u00e9 preciso encontrar a grande Lei do cora\u00e7\u00e3o, a Lei que n\u00e3o seja uma lei, uma pris\u00e3o, mas um guia para o Esp\u00edrito perdido no seu pr\u00f3prio labirinto. Al\u00e9m daquilo que a ci\u00eancia jamais conseguir\u00e1 alcan\u00e7ar, l\u00e1 onde os feixes da raz\u00e3o se partem contra as nuvens, existe esse labirinto, n\u00facleo central para o qual convergem todas as for\u00e7as do ser, as nervuras \u00faltimas do Esp\u00edrito. Nesse d\u00e9dalo de muralhas m\u00f3veis e sempre removidas, fora de todas as formas conhecidas do pensamento, nosso Esp\u00edrito se agita, espreitando seus movimentos mais secretos e espont\u00e2neos, aqueles com um car\u00e1ter de revela\u00e7\u00e3o, essa \u00e1ria vinda de longe, ca\u00edda do c\u00e9u\u201d. Numa outra de suas cartas, consideradas com uma de suas marcas, Artaud escreve Aos Diretores de Asilos de Loucos, e come\u00e7a afirmando que: \u201cAs leis e os costumes, concedem-lhes o direito de medir o esp\u00edrito. Esta jurisdi\u00e7\u00e3o soberana e terr\u00edvel, voc\u00eas a exercem segundo vossos pr\u00f3prios padr\u00f5es de entendimento. N\u00e3o nos fa\u00e7am rir. A credulidade dos povos civilizados, dos especialistas, dos governantes, enfeita a psiquiatria de inexplic\u00e1veis luzes sobrenaturais. A profiss\u00e3o que voc\u00eas exercem est\u00e1 julgada de antem\u00e3o. N\u00e3o pensamos em discutir aqui o valor dessa ci\u00eancia, nem a duvidosa exist\u00eancia das doen\u00e7as mentais. Por\u00e9m para cada cem pretendidas patogenias, onde se desencadeia a confus\u00e3o da mat\u00e9ria e do esp\u00edrito, para cada cem classifica\u00e7\u00f5es, onde as mais vagas s\u00e3o tamb\u00e9m as \u00fanicas utiliz\u00e1veis, quantas tentativas nobres se contam para conseguir melhor compreens\u00e3o do mundo irreal onde vivem aqueles que voc\u00eas encarceraram? Quantos de voc\u00eas, por exemplo, consideram que o sonho do demente precoce ou as imagens que o perseguem s\u00e3o algo mais que uma salada de palavras? N\u00e3o nos surpreende ver at\u00e9 que ponto voc\u00eas est\u00e3o empenhados numa tarefa para a qual s\u00f3 existem alguns poucos predestinados. Por\u00e9m nos rebelamos contra o direito concedido a certos homens \u2013 capazes ou n\u00e3o \u2013 de dar por terminadas suas investiga\u00e7\u00f5es no campo do esp\u00edrito com um veredito de encarceramento perp\u00e9tuo. E termina dizendo: \u201cEsperamos que amanh\u00e3 de manh\u00e3, na hora da visita m\u00e9dica, recordem isto, quando tratarem de conversar sem dicion\u00e1rio com esses homens sobre os quais \u2013 reconhe\u00e7am \u2013 os senhores s\u00f3 t\u00eam a superioridade da for\u00e7a\u201d. Ainda em rela\u00e7\u00e3o ao seu desafio sobre a ideia de sanidade e loucura, Artaud faz o seu desafio: \u201cSenhores! E o que \u00e9 um aut\u00eantico louco? \u00c9 um homem que preferiu enlouquecer no sentido em que a sociedade entende a palavra em vez de trair uma determinada id\u00e9ia superior de honra humana. Assim, a sociedade mandou estrangular nos seus manic\u00f4mios todos aqueles dos quais queria se desembara\u00e7ar ou se defender porque eles se recusavam a ser c\u00famplices em certos atos de suprema sujeira. Pois o louco \u00e9 tamb\u00e9m o homem que a sociedade n\u00e3o quis ouvir e que \u00e9 impedido de enunciar certas verdades insuport\u00e1veis\u201d. Na obra Para acabar com o julgamento de deus (que, inclusive, faz quest\u00e3o de escrever deus com letra min\u00fascula), Artaud se insere contra a mitologia crist\u00e3 via coloniza\u00e7\u00e3o europeia. Num dos trechos dessa obra radiof\u00f4nica ele diz que: \u201cE de onde vem essa obje\u00e7\u00e3o \u00e0 imund\u00edcie? Do fato de que o mundo n\u00e3o \u00e9 ainda constitu\u00eddo, ou de que o homem n\u00e3o tem mais que uma pequena id\u00e9ia do mundo e que ele quer eternamente guardar? Isso vem do que um homem, um belo dia, tem conclu\u00eddo a ideia de mundo. Duas rotas se oferecem a ele essa do infinito exterior essa do \u00ednfimo interior. E ele tem preferido o \u00ednfimo interior. L\u00e1 onde ele n\u00e3o tem que comprimir… o rato a l\u00edngua o \u00e2nus ou a glande. E deus, ele mesmo apressou o movimento. Deus \u00e9 um ser? Se ele \u00e9, \u00e9 merda. Se ele n\u00e3o \u00e9 ele n\u00e3o \u00e9. Ora, ele n\u00e3o \u00e9, mas como o vazio que avan\u00e7a com todas as suas formas\u201d. Uma das quest\u00f5es mais interessantes que podemos notar nessa obra Para acabar com o julgamento de deus, \u00e9 sua preocupa\u00e7\u00e3o com uma cultura que, de alguma forma, ele acreditava estar livre do pensamento ocidental, em especial, o europeu. Trata-se do seu encontro com os Tarahumaras no M\u00e9xico, quando os visitou em 1936. Obviamente, ele se decepcionou em algum sentido, considerando que os mesmos j\u00e1 estavam afetados pelos invasores europeus. E, baseado nisso, regata o Ritual do Tutuguri ou o Rito do Sol Negro, onde coloca em quest\u00e3o o encontro das culturas. E nessa obra ele cria a senten\u00e7a do Corpo Sem \u00d3rg\u00e3os que muita gente tem se debru\u00e7ado em explicar, infelizmente aos olhos da psican\u00e1lise ou da sociologia, perdendo assim a possibilidade de compreender o grito de seu esp\u00edrito em busca de uma po\u00e9tica origin\u00e1ria. Para Artaud, o Corpo Sem \u00d3rg\u00e3os significa submeter o homem a uma cirurgia. Mas n\u00e3o se trata de uma cirurgia medicinal e \u2013 sim \u2013 de uma opera\u00e7\u00e3o ontol\u00f3gica, onde o homem deveria raspar toda a sua carne e recriar-se a partir do seu osso. Limpar-se de todos os desejos constru\u00eddos pelos psicologismos e pelo mito da chamada civiliza\u00e7\u00e3o. Uma aboli\u00e7\u00e3o dos desejos em prol da vontade, daquilo que est\u00e1 em pot\u00eancia nesses seres origin\u00e1rios. De fato, a verdadeira obsess\u00e3o de Artaud \u00e9 a pureza. E, para alcan\u00e7ar essa pureza ele necessita destruir a imund\u00edcie, mas para destru\u00ed-la ele precisa fazer com que ela apare\u00e7a ao dia em toda a sua imensa sujeira, tir\u00e1-la do estado enrustido ou recalcado como instrumento de defesa e traz\u00ea-la \u00e0 tona para despeda\u00e7\u00e1-la. Por isso, muitas vezes, o exerc\u00edcio da obscenidade, da porcaria, espalhando a fecalidade em abund\u00e2ncia. A vontade de Artaud era fazer voar em explos\u00e3o a antiga ordem criada por \u201cdeus\u201d, para reedificar um corpo novo, como assim ele disse em alto e bom som: \u2013 \u201ceu reconstruirei o homem que sou\u201d \u2013 e enfim puro. Mas ele tamb\u00e9m acredita que essa reconstru\u00e7\u00e3o do corpo passa por uma reinven\u00e7\u00e3o da linguagem. As palavras est\u00e3o gastas e organizadas em silogismos de uma l\u00f3gica formal. E nesse sentido ele acredita que o sentido de palavra se d\u00e1 na n\u00e3o-palavra, ou seja, para que a palavra exista, faz-se necess\u00e1rio que a mesma se despoje de s\u00ea-la enquanto tal. Em certo sentido, d\u00e1-se como um existencialismo, considerando que, ao se fazer palavra, a palavra n\u00e3o se sustenta de uma fun\u00e7\u00e3o ou um significado a priori. A palavra \u00e9 uma p\u00e1 que lavra, \u00e9 uma p\u00e1 diante do terreno baldio e desconhecido da exist\u00eancia, onde se cria sulcos para uma tentativa de conhecimento e apreens\u00e3o disso que n\u00e3o sabemos o que \u00e9, desse vir a ser do esp\u00edrito que se manifesta, mesmo atrav\u00e9s de recursos da glossolalia, como, por exemplo, ainda em Pour en finir avec le jugement de dieu (Para acabar com o julgamento de deus): O reche modo to edire di za tan dari do padera coco. \u00a0 \u00a0 Para Artaud, essas glossolalias, ou seja, essas palavras-gritos s\u00e3o os gritos-sopros que certamente surpreender\u00e3o, n\u00e3o como mero espanto, mas como possibilidade de se perceber a pot\u00eancia dos ritmos e a fabulosa riqueza da inven\u00e7\u00e3o sil\u00e1bica, da liberdade do esp\u00edrito para criar e colocar-se no mundo. Mas para se ter essas experi\u00eancias, principalmente, no que se diz respeito ao teatro, Artaud acreditava que seria preciso Acabar com as obras primas, um dos cap\u00edtulos de O Teatro e seu Duplo, pois \u2013 para ele \u2013 de alguma maneira n\u00f3s somos culpados por acreditarmos que o que est\u00e1 escrito ou pintado ou formulado j\u00e1 fosse uma quest\u00e3o esgotada e que n\u00e3o fosse necess\u00e1rio romper com elas e come\u00e7ar de novo. Nesse cap\u00edtulo, Acabar com as obras primas, ele diz que: \u201c\u00c9 preciso acabar com a ideia das obras-primas reservadas a uma assim chamada elite e que a massa n\u00e3o entende; e admitir que n\u00e3o existe, no esp\u00edrito, uma zona reservada, como para as liga\u00e7\u00f5es sexuais clandestinas. As obras-primas do passado s\u00e3o boas para o passado, n\u00e3o para n\u00f3s. Temos o direito de dizer o que foi dito e mesmo o que n\u00e3o foi dito de um modo que seja nosso, imediato, direto, que responda aos modos de sentir atuais e que todo o mundo compreenda.\u201d Artaud acredita que se o povo se desacostumou e n\u00e3o lhe interessa ir ao teatro e consider\u00e1-lo como uma arte inferior e usado meramente como uma sa\u00edda para nossos maus instintos, \u00e9 porque fomos habituados desde a Renascen\u00e7a a pensar no teatro como puramente descritivo, como uma mentira e uma ilus\u00e3o que n\u00e3o faz outra coisa sen\u00e3o tentar narrar a psicologia do nosso tempo. E, da psicologia, ele acredita que ela cumpre o vergonhoso papel de reduzir o desconhecido ao conhecido. Da mesma forma como o teatro vem cumprindo essa tarefa de fazer viver em cena seres plaus\u00edveis, com o espet\u00e1culo de um lado e a plateia do outro, sem o ritual onde todos est\u00e3o inclu\u00eddos. E novamente ele se manifesta iconoclasta, primeiro, com S\u00f3focles: \u201c\u00c9 idiotice censurar a massa por n\u00e3o ter o senso do sublime, quando se confunde o sublime com uma de suas manifesta\u00e7\u00f5es formais que s\u00e3o, ali\u00e1s, e sempre, manifesta\u00e7\u00f5es mortas. E se, por exemplo, a massa de hoje j\u00e1 n\u00e3o compreende \u00c9dipo rei, ouso dizer que a culpa \u00e9 de \u00c9dipo rei e n\u00e3o da massa. Em \u00c9dipo rei h\u00e1 o tema do Incesto e a ideia de que a natureza zomba da moral; e que em algum lugar h\u00e1 for\u00e7as errantes com as quais seria bom tomar cuidado; que se d\u00ea a essas for\u00e7as o nome de destino ou outro qualquer. Al\u00e9m disso, h\u00e1 a presen\u00e7a de uma epidemia de peste que \u00e9 uma encarna\u00e7\u00e3o f\u00edsica dessas for\u00e7as. Mas tudo isso sob disfarces e numa linguagem que perderam qualquer contato com o ritmo epil\u00e9ptico e grosseiro deste tempo. S\u00f3focles talvez fale alto, mas com modos que j\u00e1 n\u00e3o s\u00e3o desta \u00e9poca. Ele fala fino demais para esta \u00e9poca, e parece que ele fala de lado\u201d. E, depois, com o famoso bardo ingl\u00eas: \u201cO pr\u00f3prio Shakespeare \u00e9 respons\u00e1vel por esta aberra\u00e7\u00e3o e degrada\u00e7\u00e3o, por essa ideia desinteressada do teatro que quer que uma representa\u00e7\u00e3o teatral deixe o p\u00fablico intacto, sem que uma imagem lan\u00e7ada provoque qualquer abalo no organismo, imprimindo nele uma marca que n\u00e3o mais se apagar\u00e1. Se em Shakespeare o homem \u00e0s vezes se preocupa com aquilo que o ultrapassa, trata-se sempre, definitivamente, das consequ\u00eancias dessa preocupa\u00e7\u00e3o no homem, isto \u00e9, a psicologia. (…) Se Shakespeare e seus imitadores nos insinuaram atrav\u00e9s dos tempos uma ideia da arte pela arte, com a arte de um lado e a vida do outro, pod\u00edamos ficar tranquilos com a ideia ineficaz e pregui\u00e7osa enquanto a vida l\u00e1 fora se mantinha. Mas agora vemos muito bem os sinais indicadores de que o que nos mantinha vivos j\u00e1 n\u00e3o se mant\u00e9m, de que estamos todos loucos, desesperados e doentes. E eu nos convido a reagir\u201d. No que diz respeito \u00e0 filosofia, tamb\u00e9m parece importante localizar Artaud neste suposto \u201camor \u00e0 sabedoria\u201d. De imediato, podemos afirmar que \u2013 apesar de demonstrar ter lido obras de Plat\u00e3o, Arist\u00f3teles, S\u00f6ren Kierkegaard e alguns outros \u2013 suas grandes influ\u00eancias ou talvez coincid\u00eancia, considerando sua postura de rebeldia contra o institu\u00eddo \u2013 dois fil\u00f3sofos que marcadamente est\u00e3o presente em sua obra s\u00e3o Arthur Schopenhauer e Friedrich Nietsche. De Schopenhauer podemos nos ater em As dores do mundo, quando o fil\u00f3sofo nos apresenta uma s\u00e9rie de reflex\u00f5es sobre a exist\u00eancia, propondo uma nova forma de se pensar a dor e a felicidade, embora essa \u00faltima n\u00e3o seja um tema muito comum ao discurso de Artaud. Mas coincidindo com Artaud, os dois defendem a ideia de que ao contr\u00e1rio do bem, o mal \u00e9 que deve ser considerado positivo, uma vez que somente ele se faz, de fato, sentir. A outra obra de Schopenhauer que tamb\u00e9m nos aproxima de uma an\u00e1lise sobre Artaud, est\u00e1 em O mundo como vontade e representa\u00e7\u00e3o, quando o fil\u00f3sofo afirma a superioridade da vontade em detrimento da raz\u00e3o, inclusive, pela ideia de que toda a vida \u00e9 vontade e que raz\u00e3o serve somente para justific\u00e1-la ou reprimi-la, considerando que toda essa subst\u00e2ncia primordial chamada Vontade se estende a todos os demais seres, concebendo-a, assim, como ess\u00eancia n\u00e3o s\u00f3 do homem, mas do mundo. No caso de Nietsche, independente de outras obras que Artaud tenha lido desse fil\u00f3sofo, podemos nos amparar, levando em conta o tema do teatro, em O Nascimento da Trag\u00e9dia. Mas apesar de supostamente a crueldade de Artaud parecer uma deriva\u00e7\u00e3o da crueldade dionis\u00edaca de Nietsche, em muito eles se diferem. Se, para Nietsche, em O Nascimento da Trag\u00e9dia, os gregos conheceram e sentiram a ang\u00fastia e os horrores da exist\u00eancia a partir de uma perturba\u00e7\u00e3o do homem perante os poderes tit\u00e2nicos da natureza, representados por Moira, Prometeu, \u00c9dipo e tantos outros fazendo aparecer o esp\u00edrito apol\u00edneo como uma possibilidade de reagir em prol da vida, projetando as imagens luminosas sobre essa “parede obscura” que representa “uma vis\u00e3o profunda do horr\u00edvel da natureza\u201d, Artaud as renega para reencontrar o tr\u00e1gico na sua pureza, ou seja, entender a viol\u00eancia como algo que \u00e9 natural. De certa forma, Nietsche diante de Artaud parece apenas ser dial\u00e9tico. Mas o que \u00e9 a dial\u00e9tica sen\u00e3o a busca de uma s\u00edntese da contradi\u00e7\u00e3o de dois lados de uma mesma moeda? Se a dial\u00e9tica \u00e9 a arte do di\u00e1logo, esse somente se realiza dentro de um mesmo plano, ou seja, s\u00f3 consegue entender a diferen\u00e7a entre os iguais. Em termos de filosofia, assim como dizia Karl Marx, que \u201cos fil\u00f3sofos se limitaram a interpretar o mundo de diversas maneiras; o que importa \u00e9 modific\u00e1-lo\u201d, poder\u00edamos dizer que Artaud prop\u00f5e colocar em xeque a pr\u00f3pria ideia de interpreta\u00e7\u00e3o do mundo, considerando que, para ele, o verdadeiro pensamento \u00e9 aquele que n\u00e3o se reduz \u00e0 reitera\u00e7\u00e3o das categorias pr\u00e9-existentes, tendo em vista que acredita que o pensamento criador nasce nos v\u00e1cuos e nos novos espa\u00e7os e a pr\u00f3pria inquietude humana inaugura na tentativa de compreender a exist\u00eancia. Podemos dizer que Artaud se dissocia dessa heran\u00e7a da filosofia de um pensamento que pensa somente em torno de si mesmo, na medida em que ele prop\u00f5e a uma esp\u00e9cie de n\u00e3o-pensar. Mas esse n\u00e3o-pensar \u00e9 n\u00e3o pensar sobre o pensado e, sim, pensar o n\u00e3o pensado, ou seja, dar voz \u00e0 pr\u00f3pria exist\u00eancia ao esp\u00edrito do ser que n\u00e3o se sente contemplado diante da racionalidade de um mundo conceitual e impostor. Finalmente, levando em conta o momento atual e a pandemia, soa plaus\u00edvel pensar em O Teatro e a Peste, um cap\u00edtulo do livro O Teatro e seu Duplo, de Antonin Artaud. Neste texto, Artaud se refere \u00e0 peste de 1947, em Floren\u00e7a, e a de 1720, em Marselha. Apesar de acontecimentos de uma certa forma datados, para Artaud, os acontecimentos em si mesmos n\u00e3o s\u00e3o o mais importante. Conforme sua proposta na forma\u00e7\u00e3o do Teatro Alfred Jarry, ele diz: \u201cMas diriam, um teatro t\u00e3o afastado da vida e dos fatos das preocupa\u00e7\u00f5es atuais das preocupa\u00e7\u00f5es e dos acontecimentos no que elas encerram de mais protundo e que \u00e9 o atributo de alguns. Porei em cena acontecimentos e n\u00e3o homens. E ser\u00e1 o assunto escolhido devido \u00e0 sua atualidade e por todas as alus\u00f5es que ele comporta. O que interessa nos acontecimentos atuais n\u00e3o s\u00e3o os acontecimentos em si mesmos, mas o estado de ebuli\u00e7\u00e3o moral no qual eles mergulham o esp\u00edrito dos homens. O grau de tens\u00e3o extrema \u00e9 o estado de caos consciente no qual n\u00e3o cessam de nos envolver. Pois bem, \u00e9 dessa atualidade pat\u00e9tica e m\u00edtica que o teatro se desviou e \u00e9 com justa raz\u00e3o que o p\u00fablico se desinteressa de um teatro que ignora a realidade a esse ponto.\u201d Por isso, faz uma \u00e1cida cr\u00edtica ao teatro convencional, do qual n\u00e3o comunga e at\u00e9 combate e, com Robert Aron e Roger Vitrac, depois de ter rompido com o movimento surrealista de Andr\u00e9 Breton, pronuncia: \u201cO teatro convencional serve aos idiotas loucos invertidos indiv\u00edduos com instru\u00e7\u00e3o prim\u00e1ria e antipoetas positivistas ocidentais, pois este teatro fede e, inacreditalvemente, ao homem provis\u00f3rio material eu diria at\u00e9 que fede a carne putrefata e homem. O teatro tradicional est\u00e1 num adiantado estado de decad\u00eancia. Imita uma sinistra realidade e ao realizar pe\u00e7as est\u00f3rias de interesse humano cenas \u00edntimas das vidas de alguns t\u00edteres converte o p\u00fablico em fantoches e bisbilhoteiros.\u201d Nesse sentido, para Artaud, a peste parece um mal necess\u00e1rio, considerando que para ele, o teatro, assim como a peste, \u00e9 uma condi\u00e7\u00e3o decisiva, ou seja, \u00e9 uma crise que se resolve pela morte ou pela cura. Ele acredita que sob a a\u00e7\u00e3o do flagelo os princ\u00edpios que norteiam a sociedade se desfazem e a ordem at\u00e9 ent\u00e3o acreditada como o melhor dos mundos poss\u00edveis se desmoronam. Como ele afirma em O teatro e a Peste: \u201cMesmo destru\u00eddo, mesmo aniquilado e pulverizado organicamente, e queimado em suas entranhas, ele sabe que n\u00e3o se morre nos sonhos, que neles a vontade atua at\u00e9 o absurdo, at\u00e9 a nega\u00e7\u00e3o do poss\u00edvel, at\u00e9 uma esp\u00e9cie de transmuta\u00e7\u00e3o da mentira com a qual se refaz a verdade\u201d. De algum modo, nesse texto, Artaud referenda o teatro para al\u00e9m de uma mera representa\u00e7\u00e3o plat\u00f4nica do mundo, dividido entre o mundo das ideias e o mundo dos sentidos, assim como refuta o manique\u00edsmo que separa o mundo do bem do mundo do mal. Artaud descontr\u00f3i essas fronteiras, assim como, tamb\u00e9m desafaz os discursos apol\u00edneos da arte como a beleza que n\u00e3o passa de um acordo est\u00e9tico. Para ele, o teatro n\u00e3o s\u00f3 \u00e9 uma possibilidade de destrui\u00e7\u00e3o desse mundo conformado com as trag\u00e9dias como se fora meramente um des\u00edgnio dos deuses, mas tamb\u00e9m prop\u00f5e a constru\u00e7\u00e3o de uma nova forma de nos organizarmos a partir do caos que \u00e9 muito mais verdadeiro e honesto com a vida do que os tempos de bonan\u00e7a. Da\u00ed, tira proveito da peste: \u201cA peste toma imagens adormecidas, uma desordem latente e as leva de repente aos gestos mais extremos; o teatro tamb\u00e9m toma gestos e os esgota: assim como a peste, o teatro refaz o elo entre o que \u00e9 e o que n\u00e3o \u00e9, entre a virtualidade do poss\u00edvel e o que existe na natureza materializada. O teatro reencontra a no\u00e7\u00e3o das figuras e dos s\u00edmbolos-tipos, que agem como se fossem pausas, sinais de suspens\u00e3o, paradas card\u00edacas, acessos de humor, acessos inflamat\u00f3rios de imagens em nossas cabe\u00e7as bruscamente despertadas; o teatro nos restitui todos os conflitos em n\u00f3s adormecidos com todas as suas for\u00e7as, e ele d\u00e1 a essas for\u00e7as nomes que saudamos como se fossem s\u00edmbolos: e diante de n\u00f3s trava-se ent\u00e3o uma batalha de s\u00edmbolos, lan\u00e7ados uns contra os outros num pisoteamento imposs\u00edvel; pois s\u00f3 pode haver teatro a partir do momento em que realmente come\u00e7a o imposs\u00edvel e em que a poesia que acontece em cena alimenta e aquece s\u00edmbolos realizados. Esses s\u00edmbolos que s\u00e3o signos de for\u00e7as maduras, mas at\u00e9 ent\u00e3o subjugadas e sem uso na realidade, explodem sob o aspecto de imagens incr\u00edveis que d\u00e3o direito de cidadania e de exist\u00eancia a atos hostis por natureza \u00e0 vida das sociedades. Uma verdadeira pe\u00e7a de teatro perturba o repouso dos sentidos, libera o inconsciente comprimido, leva a uma esp\u00e9cie de revolta virtual e que ali\u00e1s s\u00f3 poder\u00e1 assumir todo o seu valor se permanecer virtual, imp\u00f5e \u00e0s coletividades reunidas uma atitude heroica e dif\u00edcil\u201d. Concluindo, considerando a proposta de falar sobre O Teatro de Artaud \u2013 Entre a Mitologia e a Peste, cabe ressaltar Artaud como um iconoclasta e adepto de um sentido de vida que ainda est\u00e1 para ser conhecido, inclusive, para livr\u00e1-lo da mitologia entendida como a constru\u00e7\u00e3o de um mundo cujos mitos exercem o papel de supera\u00e7\u00e3o das fraquezas humanas, creio que para situ\u00e1-lo no tempo e no espa\u00e7o, est\u00e1 mais para a utopia como o “\u03bf\u03c5”\u00a0(n\u00e3o) e “\u03c4\u03bf\u03c0\u03bf\u03c2” (lugar), na etimologia grega, o n\u00e3o-lugar, ou seja, um lugar que n\u00e3o existe na realidade.\u00a0Mas para Artaud a utopia \u00e9 o n\u00e3o-lugar que precisa ser constru\u00eddo pelo teatro. N\u00e3o \u00e9 por acaso que ele afirma num de seus textos: \u201c\u00c9 preciso acreditar num sentido renovado pelo teatro onde o homem impavidamente torna-se senhor daquilo que ainda n\u00e3o existe e o faz nascer e tudo que ainda n\u00e3o nasceu vir a nascer contanto que n\u00e3o nos contentamos com ser simples \u00f3rg\u00e3os de registro.  ","og_url":"https:\/\/teatrohoje.com.br\/2021\/12\/30\/o-teatro-de-artaud-entre-a-mitologia-e-a-peste\/","og_site_name":"Teatro Hoje","article_publisher":"https:\/\/www.facebook.com\/TeatroHoje\/","article_published_time":"2021-12-30T15:36:19+00:00","article_modified_time":"2022-06-13T12:14:38+00:00","og_image":[{"width":512,"height":336,"url":"https:\/\/teatrohoje.com.br\/wp-content\/uploads\/2021\/12\/Antonin-Artaud.jpg","type":"image\/jpeg"}],"author":"Wilson Co\u00ealho","twitter_card":"summary_large_image","twitter_misc":{"Escrito por":"Wilson Co\u00ealho","Est. tempo de leitura":"24 minutos"},"schema":{"@context":"https:\/\/schema.org","@graph":[{"@type":"WebPage","@id":"https:\/\/teatrohoje.com.br\/2021\/12\/30\/o-teatro-de-artaud-entre-a-mitologia-e-a-peste\/","url":"https:\/\/teatrohoje.com.br\/2021\/12\/30\/o-teatro-de-artaud-entre-a-mitologia-e-a-peste\/","name":"O TEATRO DE ARTAUD - ENTRE A MITOLOGIA E A PESTE - Teatro Hoje","isPartOf":{"@id":"https:\/\/teatrohoje.com.br\/#website"},"primaryImageOfPage":{"@id":"https:\/\/teatrohoje.com.br\/2021\/12\/30\/o-teatro-de-artaud-entre-a-mitologia-e-a-peste\/#primaryimage"},"image":{"@id":"https:\/\/teatrohoje.com.br\/2021\/12\/30\/o-teatro-de-artaud-entre-a-mitologia-e-a-peste\/#primaryimage"},"thumbnailUrl":"https:\/\/teatrohoje.com.br\/wp-content\/uploads\/2021\/12\/Antonin-Artaud.jpg","datePublished":"2021-12-30T15:36:19+00:00","dateModified":"2022-06-13T12:14:38+00:00","author":{"@id":"https:\/\/teatrohoje.com.br\/#\/schema\/person\/5990ad96674fc85b0995662cb21472b4"},"breadcrumb":{"@id":"https:\/\/teatrohoje.com.br\/2021\/12\/30\/o-teatro-de-artaud-entre-a-mitologia-e-a-peste\/#breadcrumb"},"inLanguage":"pt-BR","potentialAction":[{"@type":"ReadAction","target":["https:\/\/teatrohoje.com.br\/2021\/12\/30\/o-teatro-de-artaud-entre-a-mitologia-e-a-peste\/"]}]},{"@type":"ImageObject","inLanguage":"pt-BR","@id":"https:\/\/teatrohoje.com.br\/2021\/12\/30\/o-teatro-de-artaud-entre-a-mitologia-e-a-peste\/#primaryimage","url":"https:\/\/teatrohoje.com.br\/wp-content\/uploads\/2021\/12\/Antonin-Artaud.jpg","contentUrl":"https:\/\/teatrohoje.com.br\/wp-content\/uploads\/2021\/12\/Antonin-Artaud.jpg","width":512,"height":336,"caption":"Antonin Artaud"},{"@type":"BreadcrumbList","@id":"https:\/\/teatrohoje.com.br\/2021\/12\/30\/o-teatro-de-artaud-entre-a-mitologia-e-a-peste\/#breadcrumb","itemListElement":[{"@type":"ListItem","position":1,"name":"In\u00edcio","item":"https:\/\/teatrohoje.com.br\/"},{"@type":"ListItem","position":2,"name":"O TEATRO DE ARTAUD – ENTRE A MITOLOGIA E A PESTE"}]},{"@type":"WebSite","@id":"https:\/\/teatrohoje.com.br\/#website","url":"https:\/\/teatrohoje.com.br\/","name":"Teatro Hoje","description":"Revista digital de Artes C\u00eanicas","potentialAction":[{"@type":"SearchAction","target":{"@type":"EntryPoint","urlTemplate":"https:\/\/teatrohoje.com.br\/?s={search_term_string}"},"query-input":"required name=search_term_string"}],"inLanguage":"pt-BR"},{"@type":"Person","@id":"https:\/\/teatrohoje.com.br\/#\/schema\/person\/5990ad96674fc85b0995662cb21472b4","name":"Wilson Co\u00ealho","image":{"@type":"ImageObject","inLanguage":"pt-BR","@id":"https:\/\/teatrohoje.com.br\/#\/schema\/person\/image\/","url":"https:\/\/secure.gravatar.com\/avatar\/ec103ba69ed682e1971f2376172b112a?s=96&d=mm&r=g","contentUrl":"https:\/\/secure.gravatar.com\/avatar\/ec103ba69ed682e1971f2376172b112a?s=96&d=mm&r=g","caption":"Wilson Co\u00ealho"},"description":"Wilson\u00a0Co\u00ealho\u00a0\u00e9 poeta, tradutor, palestrante, dramaturgo e escritor com 23 livros publicados, licenciado e bacharel em Filosofia e Mestre em Estudos Liter\u00e1rios pela Universidade Federal do Esp\u00edrito Santo, Doutor em Literatura Comparada pela Universidade Federal Fluminense e\u00a0Auditor Real\u00a0do Coll\u00e8ge de Pataphysique de Paris, do qual recebeu, em 2013 o diploma de \u201cCommandeur Exquis\u201d.\u00a0 Assina a dire\u00e7\u00e3o de 26 espet\u00e1culos montados com o Grupo Tarahumaras de Teatro, com participa\u00e7\u00e3o em festivais e semin\u00e1rios de teatro no pa\u00eds e no exterior, como Espanha, Chile, Argentina, Fran\u00e7a e Cuba, ministrando palestras e oficinas.\u00a0Ao longo deste trabalho de pesquisa, o Grupo tornou-se objeto de estudo da francesa\u00a0Catherine\u00a0Faudry\u00a0em sua tese, na Universit\u00e9 Stendhal, Grenoble-France, intitulada \u201cTh\u00e9\u00e2tre au Br\u00e9sil: Explotation des Tendances Actueles dans la Recherche d\u2019une Communication avec le Public\u201d.\u00a0Tamb\u00e9m tem participado como jurado em concursos liter\u00e1rios e festivais de m\u00fasica. 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