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Seu Neyla

SEU NEYLA / Uma auto homenagem digna do Rock in Rio

O espetáculo começa de forma bombástica: enquanto explodem os primeiros compassos de Assim Falou Zaratustra, de Richard Strauss, dezenas de focos de luz branca se espalham e se entrecruzam pelo teto e paredes laterais do Teatro Riachuelo como se estivessem flagrando aviões da Luftwaffe em voos rasantes. A impressão inicial, portanto, é a de que não iremos assistir a uma simples peça, mas algo grandioso e feérico que poderia estar rolando no Rock in Rio, com telão de cinco metros de altura por 2,5 de comprimento e tudo o que se tem direito. Em seguida, forma-se um quadrado azul de led, como se estivéssemos num lisérgico show do Pink Floyd ou Ryhanna.
Mesmo sabendo de antemão que veremos uma comédia musical biográfica do ator Ney Latorraca, intuímos que a coisa é séria, pois essas traquitanas técnicas são de alta tecnologia e não devem ter saído barato. Muita grana foi investida e, provavelmente, o retorno é certo.
Essa grandiloquência gongórica não é à toa: ela pretende nos envolver numa aura onírica com o intuito explícito de nos revelar as várias facetas de Ney ao longo de sua trajetória de sessenta anos distribuída entre o teatro, o cinema e a TV. A surpresa vem em seguida: o ator não estará no palco, fará sua apresentação diretamente de sua casa (com a lareira crepitando ao fundo), numa interação on line com os atores-cantores que revisitarão sua carreira através de vários eventos cronológicos desde sua infância até o estrelato, mas principalmente pelos inúmeros personagens icônicos que criou.
Os atores se revezam ao encarnarem personalidades do teatro, como Tônia Carrero, Marília Pêra, Walmor Chagas, Nathalia Timberg, Cacilda Becker, Maria Della Costa, entre outros e que tiveram (de uma forma ou outra) contato e foram determinantes para a formação de Latorraca e contracenaram com ele, além de interpretarem instantes de sua vida, com destaque especial à atuação de sua mãe, que sempre acreditou em seu talento, mas preocupou-se quando ele disse que iria seguir a carreira artística.
O texto de Heloísa Périssé não se encaixa numa dramaturgia propriamente dita, é mais um roteiro que alinhava e entrelaça os diversos momentos artísticos e pessoais do ator ao longo da vida, mas a direção de José Possi Neto (uma pena) é mais burocrática do que criativa.
O que dizer do elenco? São mais cantores que atores, aliás uma constante nos musicais atuais. Somando tudo, o espetáculo funciona. A plateia gosta, ri de algumas coisas, não entende outras (por absoluta falta de referências em relação ao passado) e aplaude freneticamente ao fim de cada música.
Ney Latorraca não está completamente à vontade em Seu Neyla, percebe-se algum delay na interação com os atores no palco, mas isso pouco importa. Há quem ache Jacques Tati icônico, há quem ache Ney icônico. Sem juízo de valores, cada um com suas prioridades. O gosto pessoal não entra no mérito. O que vale é a intenção: se era para fazer uma homenagem com um musical comercial, ela foi bem-sucedida e ponto final. O resto, são filigranas críticas que não cabe aqui mencionar, pois, afinal, ele e Marco Nanini entraram para o Guinness Book com O Mistério de Irma Vap, o único espetáculo que permaneceu em cartaz durante onze anos com o mesmo elenco. Contra fatos, não há argumentos.

Seu Neyla está em temporada no Teatro Riachuelo. Mais informações, como dias, horário, endereço, ficha técnica, ingressos, veja em https://teatrohoje.com.br/2022/07/24/seu-neyla/